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A viagem de John Mawe ao Centro-Norte da província
sábado, 31 de julho de 2010
No meado do século XVIII o ouro das Minas Gerais já estava no fim. Grande parte daquele ouro, no século anterior, fora carreado para Portugal para que aquele pequeno país pudesse transferi-lo para a Inglaterra em pagamento dos vultosos empréstimos lá adquiridos e que, por muito tempo, permitiu que ele pudesse sustentar uma nobreza que se equiparasse às dos seus vizinhos europeus.
Naquele século, em 1767, o sargento-mor Vieira Leitão, por ordem do senhor conde da Cunha, governador do Rio de Janeiro, riscou uma Carta Geográfica da Capitania do Rio de Janeiro e nela, na sua parte centro-norte, aparecia a inscrição: “SERTÃO OCUPADO PORVÁRIAS NAÇOENS DOS INDIOS BRABOS”. Esta inscrição, certamente, foi incluída por ordem superior para evitar os faiscadores de ouro. Este ouro, a não ser alguma pequena quantidade bateada dos rios de Cantagalo, não existia na região. No fim daquele século e no início do século XIX, ante a evidencia da sua inexistência, começou a distribuição de sesmarias na região.
No início dos anos 1800, provavelmente em 1807, aqui chegou John Mawe, mineralogista inglês, contratado pela corte portuguesa para verificar a possível existência de riquezas minerais no interior do Brasil.
Em 1809 dois homens apareceram na Casa da Moeda do Rio de Janeiro dizendo terem encontrado prata na região de Cantagalo. Mawe foi convocado e mandado fazer uma verificação no local. Munido de um ‘salvo-conduto’ e de um roteiro, saiu do Rio de Janeiro em 10 de abril de 1809. Seguiu, até o Morro Queimado pelo mesmo caminho seguido depois pelos imigrantes suíços em 1819/1820. Pela sua descrição das dificuldades encontradas não só na baixada como, principalmente, na subida da serra da Boa Vista, podemos imaginar os enormes sacrifícios que tiveram de ser superados pelos suíços, principalmente pelas mulheres, crianças e idosos que faziam parte daquela imigração.
A descida da serra para a fazenda de Morro Queimado ele a fez pela encosta norte do hoje chamado Morro do Garrafão, mesmo caminho utilizados pelos suíços. Na descrição que faz deste trecho Mawe diz ter passado, antes de ter chegado à Fazenda do Morro Queimado, por “duas pobres fazendas solitárias”. Seria uma delas, provavelmente, a “Fazenda do Cônego”, mais tarde adquirida pelo barão de Nova Friburgo? E a outra, qual seria?
A sede da Fazenda do Morro Queimado ficava no exato local onde hoje está o Colégio Anchieta. As suas terras abrangiam toda a extensão da atual cidade de Nova Friburgo e seus bairros, à exceção do Campo do Coelho para cima. Elas, ele diz, “pareciam bem apropriadas a uma fazenda de criação, mas a temperatura era muito fria para o plantio de produtos comuns do país.” Diz mais que “o milho, como alimento destinado aos porcos, é o principal produto” e mais que “a propriedade é infestada, de vez em quando, por onças que se cevam no gado novo...”. Ele fala do frio da região e diz que, de manhã, o seu termômetro registrava nove graus centígrados, embora ainda estivesse no mês de abril.
No dia seguinte à sua chegada John Mawe, ao meio-dia, seguiu viagem para Cantagalo. Lá informou ele sobre o ouro existente nos rios da região e disse que era insignificante a quantidade encontrada e que a região não apresentava minerais, a não ser a existência de calcário, que podia estar sendo aproveitado na fabricação de cal para as construções, enquanto a cal lá produzida era preparada com conchas vindas de Porto das Caixas... Diz ele: “As montanhas, como descobri depois, são da mesma substância”. São elas as montanhas de onde hoje se extrai o calcário para as fábricas de cimento daquela região.
Mawe, em Cantagalo, foi ao distante local onde, diziam, teria sido encontrada a prata. Ele apanhou amostras da areias no local onde disseram ter sido ela encontrada e, após exame meticuloso, constatou que se tratava apenas de “granito com granadas e pequenos cristais de pirita” sem nenhum valor comercial.
Essa viagem de John Mawe a Cantagalo, que se estendeu até quase ao Rio Paraíba, deve ter contribuído para a completa abertura ao povo de toda a Província do Rio de Janeiro.

Carlos Jayme Jaccoud
Um pouco de história
Carlos Jayme Jaccoud é historiador.
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