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Os bondinhos do barão e a Rua do Arco
sábado, 31 de julho de 2010
Estávamos no fim do primeiro semestre de 1870.
A Vila de Nova Friburgo levava a sua vida pacata de sempre mas as cabeças dos seus moradores estavam em ebulição. Acabara de chegar à Vila a notícia de que o governo da província autorizara a continuação da construção da estrada de ferro de Cachoeiras para Nova Friburgo. Era o progresso que vinha chegando. O barão de São Clemente, filho do primeiro barão de Nova Friburgo, que acabara de construir uma linha de bondes com tração animal, que ligava a residência da família até a sua Fazenda do Cônego, pediu licença à Câmara para levá-la até em frente à estação da estrada de ferro que iria começar a ser construída. Esse pequeno ramal de bondes ligaria a frente da estação ferroviária à sua fazenda e permitiria o escoamento da sua produção agrícola e mais a dos tijolos e telhas da grande olaria que lá estava construindo. O Barão com a sua perspicácia, já havia enxergado a importância e necessidade de ligar a sua fazenda e a olaria à futura estação da Estrada de Ferro da Vila. No local em frente a esta, na antiga Rua General Câmara, mandou levantar um prédio assobradado e sob ele um local coberto para estacionamento dos bondes onde, ao abrigo das chuvas, podiam aguardar as chegadas dos futuros trens da Estrada de Ferro. Aquele prédio passou a ser conhecido como o Arco. O trecho de caminho de ligação entre este e o Paissandu passou a ser conhecido como a Rua do Arco, denominação que perdurou por mais de um século e só desapareceu há poucos anos quando passou a ser Rua Comandante Ribeiro de Barros. Os carros, puxados por burros, que circulavam sobre aqueles trilhos passaram a ser conhecidos como os bondinhos do barão.
A primeira linha do bondinho foi iniciada pelo barão de São Clemente no início de 1870 e ligava os fundos da casa da família, na Praça Princesa Izabel, à fazenda do Cônego. Como ainda não havia sido feita a retificação do início do rio Bengalas, os trilhos, atravessando o Paissandu, passavam por uma ponte por ele construída sobre o rio Cônego, seguia pelo Caminho dos Velhacos e sobre uma outra ponte, no Rio Bengala, nos fundos do casarão da família, na Praça Princesa Izabel, casa essa que hoje abriga parte da Secretaria de Cultura. Mais tarde, em 1887, já estando retificado o trecho do Rio Bengalas, desde a sua formação até a Ponte do Suspiro, o então Visconde de Nova Friburgo propôs à Câmara fazer, às suas custas, o aterro projetado da avenida beira-rio até os fundos da casa acima citada, se a Câmara o autorizasse a transferir para ela os trilhos do seu bondinho que passavam pela outra margem do rio. A Câmara deu a autorização, o aterro foi feito e mudados os trilhos.
Quando a família Nova Friburgo edificou o, então, por eles chamados de Pavilhão de Caça, onde hoje está o Sanatório Naval, um desvio da linha do bondinho foi levado até lá.
Veio a República e, com o correr dos anos, os Clemente Pinto foram se desfazendo das suas propriedades e desapareceram da nossa cidade e as suas propriedades foram sendo vendidas. Três de suas grandes obras permanecem vivas, continuam mostrando a sua beleza e as citamos pela ordem de construção. A primeira delas a, também, primeira residência do barão em nossa terra, em frente à praça que o segundo barão embelezou e doou as obras paisagísticas à Vila de Nova Friburgo; a segunda, o belo e grandioso Parque São Clemente, um dos mais belos parques do país, hoje pertencente e conservado pelo Nova Friburgo Country Clube e o terceiro, o belo Pavilhão de Caça, hoje a sede do Sanatório Naval de Nova Friburgo, vendido à Marinha de Guerra que o conserva, muito o ampliou e continua a prestar inúmeros serviços à cidade.
A fazenda do Cônego transformou-se em dois grandes e belos e progressistas bairros da cidade: o Cônego e a Olaria.
O que aumenta a nossa admiração é que tudo o que vimos acima começou com a pessoa simples de um jovem português pobre e sem família no Rio de Janeiro, Antonio Clemente Pinto que, amparado e incentivado por um patrício, mostrou a sua capacidade de trabalho e, com luta e tenacidade, se fez projetar no país. Na sua luta foi seguido por seus filhos Antônio (conde de Nova Friburgo) e Bernardo (conde de São Clemente), considerados os nobres mais ricos do Brasil Império e que muito e muito contribuíram para o engrandecimento da Vila de Nova Friburgo.
Uma curiosidade: pensamos ser um dos raros friburguenses vivos que tiveram a satisfação de, quando menino, ter ido e voltado do Sanatório Naval num daqueles bondinhos.

Carlos Jayme Jaccoud
Um pouco de história
Carlos Jayme Jaccoud é historiador.
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