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Diabruras de Sebastien-Nicolas Gachet - 20 a 22 de novembro.
terça-feira, 11 de janeiro de 2011
Sabemos, pelo livro do mano Raphael um pouco da história desse suíço de Gruyères, que tem o mérito de ter sido o mentor da colonização suíça no Brasil. No seu livro História, Contos e Lendas da Velha Nova Friburgo ele diz que “não fossem suas ideias e sua interferência, o capítulo referente ao surgimento desta cidade – que certamente teria outro nome – seria narrado de maneira muito diversa e, garantimos, sem o colorido épico que o envolveu e o embelezou”.
Gachet era filho de uma família pobre e tinha um problema físico: era corcunda. Ainda pequeno foi enviado para um seminário em Versalhes e lá conheceu e tornou-se amigo íntimo de um jovem chamado Joachim Murat. Este amigo entrou para o exército e, com a Revolução Francesa, chegou ao posto de coronel e veio a casar-se com a irmã de um seu colega de farda que se chamava Napoleão Bonaparte. A sorte do pobre Gachet mudou e ele passou a ser secretário do então general Murat que foi feito rei de Nápoles pelo cunhado Napoleão. De repente as coisas mudaram. Napoleão foi derrotado pelos ingleses e Murat fuzilado pelos napolitanos. Gachet, fugido, voltou para a Suíça. Lá encontrou o povo suíço passando por grandes dificuldades em decorrência das guerras napoleônicas e de problemas atmosféricos que arruinaram a agricultura da região. Havia fome na suíça. Aí concebeu a ideia de organizar uma migração de agricultores para os terrenos férteis do Novo Mundo. Com a sua perspicácia e lábia conseguiu convencer o governo do Cantão de Fribourg e, devidamente credenciado, partiu para o Rio de Janeiro. Aqui chegado, depois de algumas dificuldades, conseguiu entrevistar-se com D. João VI que o recebeu com entusiasmo pois era sua idéia trazer imigrantes europeus para o Brasil. O contrato de imigração foi assinado para que Gachet trouxesse, a custa do rei, cem famílias de agricultores suíços do cantão de Fribourg .
A proposta do rei foi recebida na Suíça com tanto entusiasmo que Gachet resolveu ganhar dinheiro na transação. Passou a aceitar imigrantes de tudo que era gente e a cobrar as despesas de viagem dos colonos desde seus cantões de origem até o porto de embarque na Holanda. Isto sem falar da “mutreta” que fez com o transporte de contrabando da Suíça para aquele país. Lá, em vez de cerca de 800 imigrantes do cantão de Fribourg, foram embarcados, em oito navios, cerca de 2.100 suíços de todos os cantos da Suíça. Até gente de prisões suíças foi arrebanhada.
A desobediência ao tratado firmado com D. João VI trouxe grandes problemas na chegada dos imigrantes suíços a Nova Friburgo. O rei, em cumprimento às suas obrigações contratuais, determinara que o Monsenhor Miranda Malheiros, Desembargador do Paço, assumisse a função de inspetor da futura colônia suíça e, no meio das matas da fazenda do Morro Queimado, providenciasse a construção de cem casas que serviriam de abrigo provisório às cem famílias suíças contratadas com Gachet. As casas de quatro cômodos para acomodarem, provavelmente, de seis a oito pessoas de cada família foram construídas. Imaginem o problema criado quando aqui chegaram, para serem acomodados nas cem casas, cerca de 1600 imigrantes portando cerca de 500 sobrenomes e que, durante a viagem, conseguiram sobreviver às doenças adquiridas nos brejos da Holanda.
A ambição de Gachet era grande. Segundo uma carta que ele enviou da Europa para o Monsenhor Miranda em 30 de maio de 1818 e que encontramos no Arquivo Nacional, ficamos sabendo que a sua esposa e filhos, aqui deixados, já ocupavam os “Inhames” (área à margem direita do Bengalas e em frente à atual Duas Pedras), provavelmente recebida daquele monsenhor e onde ele queria que fosse feita pela administração da colônia “uma casa com assoalho, forro e janelas com vidros” para a sua família e onde tencionava construir uma fabrica de queijos quando chegasse com os imigrantes. E mais, lembrava ao Monsenhor Miranda: “...quanto à sesmaria que V. Exa. prometeu obter-me, reservo indicar a localização que eu queira, logo que eu chegue da Europa”... e mais: “Eu me apoio inteiramente na amizade do Monsenhor (...) para que dê os passos convenientes afim de que eu possa receber a Ordem de Cristo...” A sua vaidade era imensa: além de uma sesmaria, uma comenda real!
A sorte que sempre protegeu Gachet esqueceu-se dele. O navio que o trouxe, o Camillus, foi o último a chegar ao Rio de Janeiro. Problemas havidos quando ainda navegava em mares europeus obrigou-o a passar um bom tempo em reparos num estaleiro da Inglaterra. Quando ele aqui chegou a história das suas bandalheiras já eram bem conhecidas pela Coroa. Gachet caiu em desgraça. Foi preso por algum tempo e proibido de chegar a Nova Friburgo. Abrigou-se algum tempo na região do Rio Paraíba, depois em Angra dos Reis e desapareceu. Que Deus tenha se apiedado de sua alma.

Carlos Jayme Jaccoud
Um pouco de história
Carlos Jayme Jaccoud é historiador.
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