Sustentação

sábado, 21 de abril de 2018

Na semana passada vimos os conceitos básicos a respeito de como o desenho do automóvel pode influenciar no tipo de resistência oferecida pela atmosfera ao seu avanço, e o impacto decisivo que esse fator exerce sobre a velocidade máxima e o consumo em velocidades mais altas. Mas, ao fazermos isso, apenas tangenciamos a vastidão de interações possíveis entre o ar e veículo em deslocamento. Dessas, a que mais nos interessa diz respeito às mudanças no valor da força normal entre pneus e piso provocadas pelo contato com o ar. Ou, colocando em termos perigosamente leigos, a forma como a ação do ar em altas velocidades faz com que o carro pareça mais leve ou mais pesado.

O assunto é vasto e possui inúmeras camadas de aprofundamento. De novo, não nos interessa mergulhar em Física muito pesada, mas apenas entender o conceito básico a respeito de um efeito que torna possível, por exemplo, o voo dos aviões. Estamos falando do fenômeno chamado de sustentação.

Para entender a sustentação, antes é importante ter em mente que o ar “adere” à superfície do veículo, da mesma forma como a água que escorre por uma superfície impermeável continuará a escorrer junto a ela, mesmo que esta seja posta na diagonal, desde que a um ângulo não muito horizontalizado. Essa zona de interação do ar junto à superfície em movimento é chamada de camada limite, e quando ela se torna crítica e ameaça “desgrudar” da asa de um avião – quer seja pela baixa velocidade, quer seja pelo ângulo de ataque demasiadamente agressivo, por exemplo – é possível sentir uma vibração a qual se dá o nome de pré-estol. Existem vídeos na internet que mostram esse fenômeno (a busca também pode ser feita em inglês, usando o termo stall).

Dito isso, vem o segundo ponto importante. Quando um carro corta o ar, ele o divide em dois fluxos: um que passa por cima e outro que passa por baixo, correto? Bom, esses dois fluxos voltam a se encontrar quando o veículo passa pelo local, mas isso não significa que ambos tenham “percorrido a mesma distância” durante o período de separação. E este é o nosso ponto crucial.

Aprendemos, lá nos tempos da escola, que a densidade está diretamente relacionada à quantidade de massa distribuída por determinado volume. Certo, então se um dos lados percorreu uma distância maior no mesmo tempo, podemos admitir que esse fluxo foi acelerado. Na prática, isso significa que houve uma dilatação do volume ocupado pela mesma massa, o que reduz a densidade e a pressão neste mesmo espaço.

A asa do avião é desenhada justamente para assegurar que o fluxo que a contorna por cima percorra caminho maior do que aquele que a descreve por baixo. Assim, assegura-se que a pressão atmosférica na parte de cima da asa seja menor do que embaixo, gerando sucção pelo mesmo princípio que faz com que bebidas possam ser sugadas através de canudos. Já nos carros a intenção é a oposta, de que a zona de baixa pressão fique abaixo do assoalho, fazendo com que o veículo não fique instável quando em altas velocidades.

Gerar zonas de baixa pressão, no entanto, não basta para obter os resultados eventualmente desejados. Afinal, sem a devida proteção, a pressão seria naturalmente equalizada por ventos laterais, roubando a eficiência da sucção da mesma forma como um furo prejudica o funcionamento de um canudo.

A forma como esses ambientes são protegidos é o assunto de nosso próximo encontro.

Até lá!

 

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Márcio Madeira da Cunha

Sobre Rodas

O versátil jornalista Márcio Madeira, especialista em automobilismo, assina a coluna semanal com as melhores dicas e insights do mundo sobre as rodas

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