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Uber
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Dias atrás a coluna recebeu uma respeitosa e fundamentada mensagem enviada por uma advogada, questionando a competência das câmaras de vereadores para legislar sobre trânsito e transporte, no embalo da proposta que determinou a regulamentação do Uber.
Em seguida o Massimo encaminhou o conteúdo, preservando a identidade da fonte, a fim de que pudesse ser comentado pela base que aprovou a emenda.
Pinga-fogo
O resultado é o “pinga-fogo” abaixo, primeiro com a mensagem da advogada, e em seguida a da Câmara, essencialmente como foram recebidas.
Ainda que a linguagem jurídica esteja longe de ser amigável, e que aos olhos de um jornalista as informações pudessem ser mais condensadas, o Massimo acredita que valha a leitura e o enriquecimento do debate.
Questionamento
Poucos dias atrás foi aprovado por unanimidade o texto de lei que acrescenta parágrafos ao artigo primeiro da, já existente, lei municipal 4.360/2014, a ver: “Vedam-se, sem regulamentação por lei específica de mesma natureza, serviços, plataformas de tecnologia, carona remunerada, atividade de prestadora de serviços eletrônicos de informação na área de transporte privado urbano ou atividades correlatas de natureza diversa concorrentes com o serviço permitido e regulado por esta lei”.
Data máxima vênia, a iniciativa de nossos nobres edis, mister informá-los que transcende a competência municipal a elaboração de tal texto legislativo. Nossa Carta Magna indica em seu artigo 22, inciso XI, que será de competência privativa da União, legislar sobre trânsito e transporte, competindo, de forma residual, aos municípios, tão somente a organização e prestação de serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo – de caráter essencial, como expõe o artigo 30, V da Constituição Federal. Ademais, ponto de extrema relevância é que os serviços a serem organizados e prestados são públicos, o que difere do serviço particular oferecido pelos meios alternativos de transporte de passageiro. Tanto que, no 1º caso, é imprescindível a modalidade de concessão e permissão, o 2º independe de tal formalização. Desta forma, tal lei (ou a emenda que se pretende) já é viciada em seu nascedouro, já que não cumpre as formalidades de existência mínima, qual sejam, a legitimidade e competência (no sentido processual) de quem a propõe. Mais profundamente na questão, se ultrapassado o mérito principal que é a própria inconstitucionalidade formal, tem-se que a nossa República é fincada no fundamento do valor social do trabalho e da livre iniciativa, por bem, não é uma cidade, ou uma corte legislativa local que poderá dissolver tais princípios elencados, inclusive no Art. 1º de nossa Carta Maior, visto sua importância. Tantas outras cidades pecaram pela mesma vaidade e, em simples pesquisa que poderia ter sido realizada por qualquer gabinete, se verificaria o mesmo teor, sem exceção, inclusive com pareceres da Procuradoria Geral da República e diversas jurisprudências já consolidadas. Devemos verificar, antes de qualquer coisa, que não se trata de discutir se somos a favor ou contra a matéria legislada, mas sim se ela é passível de estar sendo submetida à elaboração e votação por quem não de direito, ferindo frontalmente às bases de nossa Constituição já tão maculada.”
Contraponto
“A priori, como representantes do legislativo municipal atuantes em favor dos interesses da coletividade, em respeito às leis, reconhecemos e enaltecemos a importância de todas as opiniões, questionamentos e contribuições como forma de fortalecimento do debate democrático e salutar do tema em questão. Desta feita, manifestamo-nos como forma de devido esclarecimento e justificativa à iniciativa de lei que pretende não a proibição, mas a regulamentação do serviço prestado pela empresa Uber no município de Nova Friburgo. Mui respeitosamente, e, também, com a devida máxima vênia, observamos, oportunamente, que algumas considerações importantes foram despercebidas pela eminente autora do texto enviado. Como deveras informado, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é cristalina quando reza que compete privativamente à União legislar sobre trânsito e transporte, artigo 22, XI. Entretanto, a Carta Magna dispõe que é competência dos municípios legislar sobre assuntos de interesse local, além de organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial, artigo 30, I e V. Ao contrário da autora, quando argumenta que os “serviços a serem organizados e prestados são públicos, o que difere do serviço particular oferecido pelos meios alternativos de transporte de passageiro. Tanto que, no 1° caso, é imprescindível a modalidade de concessão e permissão, o 2° independe de tal formalização”, sabemos, todos, que, no Brasil, não existe transporte individual de passageiros de natureza privada, salvo quando um exercício de direito caracterizado, ainda, pela gratuidade. Elucidamos que, desde que gratuito, não há impedimento para o transporte privado de pessoas, todavia, quando a legislação alude ao transporte oneroso de passageiros, remete-nos a um serviço eminentemente público, passível de regulamentação pelo poder público, o que justifica, inclusive, o combate ao transporte clandestino. Dessarte, todo e qualquer serviço de transporte remunerado oferecido aos cidadãos constitui serviço público pelo ordenamento jurídico pátrio. Tal entendimento advém, sem maiores complexidades, da própria lei 12.587/12 sobre Diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana que confirma a interpretação ao conceituar como “transporte público individual” o “serviço remunerado de transporte de passageiros aberto ao público, por intermédio de veículos de aluguel, para a realização de viagens individualizadas”, em seu artigo 4, VIII. A definição ora posta se adequa perfeitamente ao Uber quanto atividade análoga à dos taxistas. Afinal, como não considerar, outrossim, informação prestada pelo site oficial da empresa segundo o qual a Uber “oferece um serviço de transporte similar ao táxi” (http://centraluber.tk/uber-entenda- como-funciona/), ou, notícia amplamente vinculada, no último dia 20 de dezembro, pelos principais meios de comunicação do mundo sobre decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia em determinar que a empresa é um serviço de transporte e não mera plataforma de tecnologia, devendo a empresa ser equiparada a outras companhias de táxi e de transporte e assim regulamentado? Conforme preceitua o artigo 174 da CRFB/88, não poderia ser admitido que o setor privado estabelecesse regras próprias a respeito do deslocamento urbano de pessoas sem observar os ditames legais atinentes à atividade econômica. Ademais, não nos parece razoável, dada a similitude indubitável entre o serviço prestado pelos táxis e os prestados pela Uber e, notadamente, quando alardeado no texto “diversas jurisprudências já consolidadas”, dessaber entendimento do Supremo Tribunal Federal, através de julgado em recurso extraordinário 1002310 (publicado em 05/12/2016, tendo como relator o ministro Gilmar Mendes), que reconhece ser a atividade de táxi um “serviço de utilidade pública” cuja autorização para exploração foi delegada ao poder público local competindo, portanto, ao administrador municipal estabelecer os requisitos autorizadores da exploração da atividade econômica privada de interesse público, bem como o modo de escolha dos autorizatários do serviço, como dispõem os artigos 12 e 12-A da lei 12.587/12, a saber: “Artigo 12. Os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas” e “artigo 12-A. O direito à exploração de serviços de táxi poderá ser outorgado a qualquer interessado que satisfaça os requisitos exigidos pelo poder público local.” Ora, se o serviço de táxi é similar ao serviço realizado pelo Uber, forçosa é a conclusão de que o acertadamente decidido pelo Supremo abrange, inevitavelmente, o transporte individual exercido através do aplicativo comentado. Concluímos que posto que a Uber presta serviço remunerado, quando o transporte de pessoas passa a ser o de passageiros e disponibilizado ao público através de aplicativo, está tipificada no artigo 4° da lei 12.587/12 que impôs limites ao livre exercício da atividade econômica, de acordo com o artigo 170 § único da CRFB/88, devendo, portanto, obedecer às restrições impostas pelo poder público municipal. Como um dos princípios asseguradores da autonomia administrativa dos municípios está a competência destes para regulamentar os serviços locais, artigo 30, V da CRFB, cabível à União a organização das diretrizes básicas sobre política nacional de transporte, trânsito e transporte) mas, aos municípios as disposições sobre transporte local e demais serviços públicos de interesse local. Para atender ao interesse local, os municípios poderiam legislar sobre o Uber, artigo 30 CRFB, não obstante competência privativa da União sobre transporte, até porque disciplinada tal delegação na já alhures comentada lei 12.587/12. Por derradeiro, superada a inconstitucionalidade formal alegada, asseguramos tão somente o exercício do nosso dever em zelar pelo bem-estar da população. Acreditamos na regulamentação da Uber (já implementada em 30 cidades, no Brasil, como Vitória e São Paulo) como forma de garantirmos a segurança jurídica necessária, assim como a qualidade do serviço prestado e, para tanto, temos reunido todos os esforços.
Massimo
Massimo
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