Um mosaico de leis

quarta-feira, 01 de outubro de 2014

Nova Friburgo, devido à sua proximidade com o Rio de Janeiro, capital do vice-reino desde 1763, sede da Corte no Império e depois capital federal da República por décadas, tem uma participação periférica por estar próxima do cenário de importantes acontecimentos políticos e de seus principais atores. Foi da política de colonização para povoamento iniciada na Era Joanina que surgiu Nova Friburgo, uma experiência pioneira. O rei determinou que a colônia de suíços ficasse o mais próximo possível da Corte para receber a sua proteção. Muitos cariocas buscavam na salubridade do clima de Nova Friburgo a cura da tuberculose, em princípios do século 19. A partir do último quartel desse século, recebe igualmente os que fugiam das epidemias de febre amarela no Rio de Janeiro. Como disse, próxima do centro político do país recebe os reflexos de importantes acontecimentos nacionais.  Nova Friburgo, nos parece, foi uma exceção do resto do Brasil, pois a sua atividade urbana suplantou a rural, devido aos serviços de hotelaria e educação, tudo isso ligado à salubridade de seu clima. Esse processo histórico redundou em maravilhosas construções na cidade, a maior parte, infelizmente, destruída para dar lugar a prédios. Foram preservados, entre outros, o antigo Hotel Central, atual Colégio Nossa Senhora das Dores, que fazia parte do complexo do Instituto de Hidroterapia, e igualmente o Colégio Anchieta.

Do ponto de vista legalista, Nova Friburgo está perfeitamente blindada quanto à preservação de seu patrimônio histórico. O Plano Diretor criou para Nova Friburgo três Zeipacs — Zona de Especial Interesse de Proteção do Ambiente Cultural — , no centro da cidade, no centro de Amparo e em Riograndina, essa última devido à preservação da memória do trem. Muitos imóveis nesse perímetro estão sob proteção do poder público, e cada um deles pode sofrer um tipo de intervenção que pode variar entre tombamento, preservação ou tutela. No plano federal o Iphan e a nível estadual o Inepac tombaram significativos prédios no município. A lei municipal 3.794/2009, regulamentando o Plano Diretor, dispõe sobre o tombamento dos bens situados no município de Nova Friburgo e outra lei municipal, 3.796/2009, denominada "Lei de Incentivo Fiscal de Bem Tombado”, estabelece procedimento para a concessão de isenção parcial do IPTU, por meio de incentivo fiscal de bem tombado. Foi igualmente criado o Conselho Municipal do Patrimônio Cultural, composto pelo secretário de Cultura, Meio Ambiente e Obras, membros do Crea, IAB, Associação de Artistas e os representantes do Iphan e do Inepac. Os dois últimos órgãos conferem, realmente, força política ao conselho que realizou, sob a orientação técnica de Lílian Barreto e Luiz Fernando Folly, importante trabalho de levantamento e inventário de imóveis que entram na categoria de patrimônio cultural do município. Finalmente, surge o decreto n.º 268, de 26 de dezembro de 2012, que determina o tombamento provisório e definitivo dos bens da área central do município de Nova Friburgo. A meu ver, esse decreto ratifica a lei municipal 3.794/2009 e inclui uma nova relação de imóveis.

 Creio que poucas cidades no Brasil tenham uma legislação como Nova Friburgo que zela, do ponto de vista legal, pelo seu patrimônio histórico. Infelizmente, a forma como esses prédios são visualizados pela população me entristece. A enorme quantidade de placas de propaganda, sem rigor estético e de mau gosto, esmaecem os prédios históricos na paisagem urbana e mal são percebidos pelos transeuntes. As posturas municipais, responsáveis por essa fiscalização, não fazem o seu papel de regulamentar essa poluição visual que além de enfeiar as ruas, obscurece os prédios históricos. A Associação Comercial não tem interesse nessa questão, protegendo seus associados. E a rede elétrica que passa pelo centro da cidade? Até 2018, as cidades com mais de 100 mil habitantes terão que adotar a rede subterrânea de energia elétrica. Por que não antecipar tal medida? Na realidade, não sei a quantas anda esse mosaico de legislação e o que se tem feito de concreto. O que sei é que volta e meia ouvimos rumores de que protegidos prédios, como a antiga delegacia da Vila Amélia e do Clube de Xadrez, serão derrubados para dar lugar a edifícios residenciais. Prefiro acreditar que são somente boatos, pois legislação não falta para proteger o nosso patrimônio histórico.


 Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora de diversos livros sobre a história de Nova Friburgo. Curta no Facebook a página "História de Nova Friburgo

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Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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