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Santo Antônio de Sá - As febres do Macacu
quarta-feira, 06 de agosto de 2014
Última parte
Região que testemunha as primeiras ocupações no Brasil colonial, a vila de Santo Antônio de Sá, além da extração da madeira, produzia açúcar e alimentos, abastecendo o Rio de Janeiro. Nesse aspecto elas tem uma particularidade: suas fazendas não se limitaram à atividade econômica agroexportadora da produção do açúcar. Dedicaram-se igualmente à lavoura branca, garantindo o abastecimento de gêneros alimentícios no Rio de Janeiro. No entanto, entrará em decadência a partir do terceiro quartel do século XIX. Alguns fatores irão contribuir para o seu declínio econômico. O primeiro fator serão as enchentes. O Rio Macacu e seus afluentes transbordavam, inundando as terras baixas, formando brejos e pântanos. Atingia igualmente as lavouras, acarretando enormes prejuízos aos fazendeiros. A enchente era tamanha que algumas propriedades ficavam tão cobertas de água que era até viável a navegação. A extração de madeira no Vale do Macacu, por mais de dois séculos, provocou um impacto ambiental significativo na região. Esse fato associado às enchentes naturais do rio irá acarretar epidemias, as febres do Macacu, como eram chamadas à época, dizimando quase uma população inteira, como foi o caso da sede da Vila de Santo Antônio de Sá. O segundo deles será a inauguração da Estrada de Ferro Cantagalo. Em 1860, a linha férrea ligando a raiz da serra (Cachoeiras de Macacu) até o Porto das Caixas para o escoamento do café de Cantagalo provocará um impacto econômico na região. Quando o ramal ferroviário entre Porto das Caixas e a raiz da serra foi inaugurado a população celebrou. A estação ficava inclusive muito próxima ao porto. Mas quando a linha se estendeu dessa localidade até Niterói, o porto deixou de ser utilizado. Como o trânsito de tropeiros que trazia movimento comercial à localidade deixara de existir, esse novo ramal provocou um impacto ainda maior. O transporte fluvial foi sendo substituído pelo trem e essa circunstância provocará o declínio de Porto das Caixas.
Santo Antônio de Sá entrou em tal decadência que em 1875 perdeu a condição de termo sendo anexada a São João de Itaboraí. Todas as freguesias que pertenceram outrora a Santo Antônio de Sá, Nossa Senhora da Conceição do Rio Bonito, Nossa Senhora do Desterro de Itamby, São José d’Rey e Nossa Senhora da Conceição do Porto das Caixas, passaram para a jurisdição de Itaboraí. Desde 1833, a freguesia de São João Batista de Itaboraí tinha sido erigida à categoria de Vila de São João de Itaboraí.
Os franciscanos do Convento de São Boaventura foram extremamente prejudicados pela extinção da Vila de Santo Antônio de Sá: perderam os dízimos e muitos também faleceram nas epidemias. Os religiosos foram aos poucos deixando o convento, ficando apenas um guardião no local. O último inventário de suas alfaias foi realizado em 1841, o que significa que foi totalmente desocupado nessa data. As obras de arte, os retábulos e o rico acervo de livros do Convento São Boaventura foram distribuídos entre as igrejas do Rio de Janeiro. Esse convento, no qual estudou o primeiro santo do Brasil, Frei Galvão, ficou durante décadas completamente abandonado. Nos últimos anos fazia parte da Fazenda Macacu, de um particular, que plantava laranjas e criava gado. Muito tardiamente foi tombado pelo Inepac, em 1978, e pelo Iphan, em 1980. Atualmente a Petrobras, através do Comperj, ocupa a região onde se localiza as ruínas do Convento de São Boaventura e a outrora sede da Vila de Santo Antônio de Sá. Segundo a Petrobras, o projeto é de um museu no local, mas isso somente ocorrerá depois de concluídas as obras de infraestrutura do Comperj. Com 40 sítios arqueológicos, já foram descobertas cerâmicas portuguesas, espanholas e inglesas, cachimbos africanos e urnas funerárias indígenas. A cada escavação nas obras de infraestrutura uma surpresa: objetos de diversas épocas são localizados. Mesmo particulares, após as cheias dos afluentes do Rio Macacu, encontram moedas nacionais e estrangeiras, do período colonial e do Império, louças, garrafas, entre outros artefatos, tudo isso testemunho de uma época de intensa atividade social e econômica.
Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora de
diversos livros sobre a história de Nova Friburgo. Curta no Facebook a página "História de Nova Friburgo”
Janaína Botelho
História e Memória
A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.
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