Qual é a relação de Amparo com Tiradentes?

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Amparo fazia parte da Freguesia de São José do Ribeirão no século XIX, e foi um grande produtor de café. A Fazenda Cachoeira, em Amparo, dos Galiano das Neves era grande produtora de café e até hoje se encontra no patrimônio da família. Na primeira metade do século XX, Amparo produzia café, milho, feijão e cana de açúcar. Gradativamente, foram sendo introduzidas a horticultura, a fruticultura e floricultura. Abastecia o Rio de Janeiro e Niterói com batata inglesa, tomate, cenoura, arroz, ervilha, repolho, nabo, aipo, batata doce, feijão e mandioca. Extensas plantações de cravo, rosa, margarida, palma, lírio, saudade, entre outras, eram vistas em suas herdades. Amparo produzia igualmente caqui, lima, tangerina, laranja, banana, pêra, uva, maçã, pêssego e ameixa. Foi um importante distrito agrícola de Nova Friburgo até aproximadamente a década de 50, do século XX, decaindo a partir de então. 

Em Amparo, sempre houve a lenda de que Tiradentes teria passado por essa região durante a Inconfidência Mineira. Daí escolas, loteamentos e ruas com o nome de Tiradentes. No entanto, o herói da inconfidência mineira nunca passou por lá. Mas há igualmente uma outra versão mais próxima da realidade, a de que teria sido o "amparo” de um inconfidente mineiro chamado Jerônimo de Castro e Souza. Certa feita, o provecto amparense Eugênio Gripp, residente na região desde 1860, declarou que o nome "Amparo” já era dado à localidade desde a sua infância e corria a boca pequena de que essa denominação tinha origem desde a Inconfidência Mineira. Jerônimo de Castro e Souza teria sido camarada de armas de Tiradentes na conspiração e com receio de ser preso, se refugiou em Cantagalo. Mas por que Jerônimo teria se refugiado em Cantagalo? Qual é a relação entre Minas Gerais e Cantagalo? No final do século XVIII, o bando de Mão de Luva se dirigira para a região onde atualmente é Cantagalo para faiscar ouro de aluvião nos rios da localidade. Esse fato deu notoriedade ao outrora Sertões do Macacu. A Coroa Portuguesa passou a distribuir sesmarias(terras) naquela região, estimulando o garimpo. Muitos mineiros se deslocaram para lá, pleiteando sesmarias, e daí a estreita  relação entre as duas províncias. Ocorre, porém, que o ouro de aluvião se esgotara e a partir de então os fazendeiros migraram para a agricultura originando o termo de Cantagalo. Jerônimo de Castro e Souza teria se estabelecido em Amparo (que era Cantagalo à época) dando a denominação ao lugarejo de "Amparo” pois se julgava "amparado” das perseguições contra os inconfidentes. Conforme Eugênio Gripp, esses fatos lhe foram narrados por Higgina de Castro Toledo, neta de Jerônimo de Castro e Souza. 

No entanto, Jerônimo foi um delator de Tiradentes, beneficiado com sesmarias pela Coroa Portuguesa em razão de sua delação na devassa contra os inconfidentes. Nos "Autos da Devassa da Inconfidência Mineira”, Jerônimo denunciou Tiradentes e como prêmio pela delação foi nomeado 1° tabelião da Vila de Cantagalo, tomando posse em 08 de outubro de 1815. Hostilizado pelos habitantes locais, foi refugiar-se nas cabeceiras do Ribeirão de São José. Logo, Amparo foi o "refúgio” de um traidor e não, o "amparo” de um inconfidente perseguido pela justiça portuguesa. No entanto, Jerônimo conseguiu que os moradores da recém-criada Vila de Nova Friburgo acreditassem em sua versão de inconfidente perseguido.

Mas essa história rendeu. Uma lei estadual de 641, de 15 de dezembro de 1938, modificou a denominação de "Amparo” para "Refúgio”, pelo motivo anteriormente exposto. Parece-nos que alguém desejava punir a localidade, outorgando-lhe a pecha de que ali se refugiara um traidor da pátria. Os moradores de Amparo protestaram e diante da pressão, a Resolução de n°220, de 6 de abril de 1953, do prefeito José Eugênio Muller, restabeleceu o nome para Amparo, em lugar de Refúgio.

O triângulo, símbolo dos inconfidentes, faz parte do brasão de armas do distrito de Amparo. Alguém já disse que é difícil destruir a força criadora do mito.


Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora de diversos livros sobre a história de Nova Friburgo. Curta no Facebook a página "História de Nova Friburgo”


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História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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