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Por dentro da história: uma imersão na Suíça
quarta-feira, 27 de agosto de 2014
Há algumas semanas atrás estive na Suíça para fazer um programa de televisão para a Luau TV. Trata-se do programa de uma hora que produzo nessa emissora, Por Dentro da História, transmitido aos domingos, às 18:30, com repetições durante a semana. Tudo se iniciou com um convite do suíço Marcel Schuwey que me ofereceu uma estrutura material e operacional caso eu fosse a Suíça realizar algum trabalho. Aceitei de pronto o convite e dirigi-me com a equipe da Luau TV para a Suíça. O roteiro organizado por Marcel Schuwey superou em muito as minhas expectativas. Que riqueza de material levei na bagagem em meu retorno ao Brasil. Que fidalguia e acolhimento fui recebida na residência de Robert e Cristiane Schuwey, cujo jardim com flores tão bem cuidadas por Cristiane não me saem da memória. Robert inclusive me deu a notícia de que já finalizou a tradução do português para o francês do livro de Henrique Bon, A Noite dos Peregrinos. Essa tradução tem uma importância muito grande pois dará acesso aos suíços a produção histórica e literária sobre a colônia helvética no Brasil. A propósito, o livro infantojuvenil do acadêmico Alberto Lima Wermelinger, "Et Les Suisses Arrivèrent”, foi traduzido por Marcel para o francês e as crianças recebem gratuitamente um exemplar e aprendem na escola a epopeia de seus antepassados em Nova Friburgo. A produção do Por Dentro da História sobre a Suíça gerou doze programas que serão exibidos na primeira semana de outubro. Inicialmente mostraremos Estavayer Le Lac, porto do qual partiram os suíços rumo a América e a igreja Saint Laurent onde foi celebrada a última missa para os colonos antes da partida. A Suíça tem uma representação muito marcante de dois produtos que são o seu cartão postal: o queijo e o chocolate. Notadamente o Gruyère, filmamos a sua produção em um Chalet d’ Alpage, cuja elaboração mantém uma tradição de séculos. Igualmente fomos a fábrica de chocolates da marca Nestlé para filmar a sua produção. Mas qual é a diferença do queijo Gruyère e do chocolate produzidos na Suíça de outras regiões do mundo? A resposta se resume em um diferencial: a pastagem. O tipo de grama no qual se alimentam as vacas na Suíça, com uma floração campesina, dá todo o diferencial ao leito e consequentemente influencia no sabor do queijo e do chocolate. A diferença é marcante e a qualidade do queijo e do chocolate suíços é superior a qualquer outro país produtor. Apesar de toda a tecnologia do qual a Suíça é exportadora, a exemplo dos relógios, boa parte de sua população não abandonou o amanho da terra e o governo corrobora para que essa tradição seja mantida. Em determinadas áreas é proibida a construção de chalets para veraneio, autorizando-se apenas os que se destinam a atividade agrícola. Com isso, evita-se a fragmentação dessa área rural em região de veraneio, preservando suas ricas pastagens para a produção leiteira. O governo igualmente incentiva a edificação tipo chalet, financiando parte dele para que seja preservado esse estilo arquitetônico que lhe é tão característico. Observando esse exemplo de preservação da tradição cultural, concluímos que Nova Friburgo, de fato, não é a Suíça brasileira. No Brasil, a arquitetura dos chalets foi moda em fins do século 19 entre a elite e Nova Friburgo ainda guarda raros imóveis na Av. Galdino do Vale com esse estilo. Uma entrevista com Martin Nicoulin, autor do livro "A Gênese de Nova Friburgo”, ilustra um dos programas. Indaguei-o sobre uma declaração que me dera há alguns anos a respeito da surpresa que tivera ao constatar que na fazenda dos Monnerat viu em uma senzala grilhões de ferro utilizado nos cativos. Nicoulin disse que como historiador não tem uma explicação sobre como os colonos suíços da primeira geração imediatamente se adaptaram aos costumes brasileiros utilizando o modo de produção escrava em suas fazendas. E fomos a região dos vinhos na Suíça. Quando os colonos aqui se estabeleceram houve a distribuição de mudas de videira aos viticultores. Da região vinícola do Valais vieram 140 e de Vaud 80 colonos suíços que nas encostas de Morro Queimado plantaram vinhas. Foram recompensados pelas autoridades brasileiras por terem produzido o primeiro vinho de Morro Queimado. Alexandre Burnier, originário de Vaud, plantou mais de 10.000 parreiras na propriedade que recebeu. Fomos a um vinhedo no Valais na residência do simpático Charlie, que nos mostrou a sua propriedade. A maioria dos viticultores vende a sua produção às cooperativas e poucos possuem marca própria. Mas o vinho da Suíça é bom? Delicioso, mas raramente iremos encontrá-los em postos de venda, pois a sua produção se limita ao consumo interno. Lazer, cultura, comportamento e esportes são igualmente temas abordados no programa. Merece destaque o castelo de Gruyère, o mirante da famosa montanha do Moleson, prédios medievais e uma paisagem paradisíaca. Imaginem que boa parte das cidades tem, em média, 800 habitantes. Não poderia deixar de citar o Clube da Cachaça no bar do Dedé, um rendez-vous de suíços que se reúnem para manter a memória da colonização suíça em Nova Friburgo. Muito mais poderia descrever, mas aproveito as últimas linhas para mais uma vez agradecer a Marcel Schuwey pela instigante Suíça que me revelou, a Robert e Christiane pela calorosa hospitalidade e a simpática Ana que me permitiu ver a Suíça sob a perspectiva de uma brasileira. Parabéns à Luau TV pelo investimento na prestação de inestimável serviço educativo e cultural a Nova Friburgo. Aos que me auxiliaram procurei responder com doze programas, os quais desejo que fiquem à altura da generosidade de todos vocês.
Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Cândido Mendes
e autora de diversos livros sobre a história deNova Friburgo.
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Janaína Botelho
História e Memória
A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.
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