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Os Monnerat: uma história familiar – Parte 3
Os irmãos Jean Joseph e Sébastian, ao ganharem dinheiro na vila de Nova Friburgo adquiram uma propriedade em Cantagalo, a fazenda Rancharia do Norte. Levaram toda a família para sua nova propriedade, ficando em Nova Friburgo apenas Ursanne Joseph, que parece ter se desentendido com Jean Joseph e Sébastian. A casa da fazenda Rancharia do Norte em que residiram era de pau-a-pique, construída aproximadamente em 1837. Os Monnerat se dedicaram à faina de tropeiros, transportando café e outras mercadorias de Cantagalo até Porto das Caixas, hoje município de Itaboraí.
Além do transporte de mercadorias, adquiriam mulas magras no Campo de Santana, no Rio de Janeiro, e as conduziam para engorda em sua propriedade, revendendo-as depois. A memória familiar diz que as mãos dos filhos do patriarca François Monnerat eram tão calejadas no manejo da enxada, da foice e do machado que se deformaram ao ponto de não poderem apertar as mãos dos conhecidos. Em 1845, Sébastian, na ocasião ainda solteiro e com 34 anos de idade, morre em um acidente quando conduzia uma tropa.
O seu inventário nos permite saber o que os Monnerat tinham em suas propriedades. Na partilha dos bens de Sébastian constam três escravos, animais de tropa, cavalos, porcos, capados de ceva, gado bovino, milho, arroz e feijão. Ainda não plantavam café. A fazenda Rancharia do Norte foi ampliada com a aquisição das propriedades Rancharia do Sul e fazenda Monte Verde, em sociedade pelos irmãos Jean Joseph e Françoise Henry Monnerat. O irmão que permaneceu em Nova Friburgo parece ter prosperado. Ursanne Joseph aparece em 1855, adquirindo terras em Banquete.
O patriarca François Xavier Monnerat viveu na fazenda Rancharia do Norte até falecer, em 1858. Não há registro do falecimento de Elizabeth Koller, sua esposa. Iniciam os casamentos entre os Monnerat e outros descendentes de colonos europeus como os Wermeliger, Erthal, Lengruber, Lutterbach, Heggendorn e Cortat. Desses, apenas os Erthal são descendentes de colonos alemães, os demais, de suíços. Além de se casarem entre os seus pares, igualmente se uniam aos primos, uma prática muito comum naquela época, inclusive entre os brasileiros e portugueses. Um dos filhos do patriarca, Jean Joseph, comprou a Fazenda São João e a Fazenda Conceição com o rendimento de fretes de suas tropas de cargueiros.
Jean Joseph faleceu em 1877, e nos parece ter sido o que mais prosperou economicamente. Seus descendentes se tornaram proprietários das fazendas Rancharia do Norte, São Vicente, Nossa Senhora da Guia, São João, Conceição, Conceição dos Pinheiros, Santo Antônio do Monte, Penedo, Jacaré e Riachuelo, além de inúmeros sítios. A linha férrea passa por dentro da fazenda Nossa Senhora da Guia, a partir de 1879.
A produção agrícola das propriedades dos Monnerat acarretou a construção da estação de trem para escoar o café e outros gêneros de suas fazendas. Desembarcavam suas mercadorias na parada denominada de “Chave de Santana”. No centro do distrito ergue-se a igreja de Nossa Senhora da Guia, construída em 1891, pela família Monnerat. O plantio do café utilizando a mão de obra escrava fez aumentar progressivamente o patrimônio desse tronco familiar.
No tocante a mão de obra escrava, não há como negar a sua utilização para amealhar fortuna naquela época. Surge na memória familiar o relato de terem dado tratamento mais humano aos escravos, se é que podemos falar em humanidade na escravidão. Diziam acolher os “caiambolas”, negros fugidos de vizinhos que maltratavam seus escravos. Negociavam o seu retorno e pediam clemência por eles. Adquiriam igualmente escravos que tinham incorrido no desagrado de seus donos, mas isso não significava ausência de rigor na disciplina no trabalho, cujos exemplos vinham diretamente de seus donos.
Ainda de acordo com a memória familiar, decretada a abolição da escravidão, a maioria dos escravos partiu das fazendas dos Monnerat pelas estradas, em delírio. No entanto, muitos regressaram como trabalhadores assalariados, colonos, meeiros e domésticas. Na fazenda Rancharia do Norte, a abolição da escravidão nada alterou o ritmo dos trabalhos. Pelos caminhos, grupos de negros embriagados festejavam a liberdade. Contudo, a turma de cativos dessa fazenda prosseguiu na capina vários dias seguidos.
Continua na próxima quinta-feira, 9.
Janaína Botelho
História e Memória
A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.
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