Os colonos pastores

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Não tenho como negar. Os doze programas que venho trabalhando para a Luau TV, roteirizando e produzindo os dez dias de filmagens na Suíça, não me fazem pensar em outra coisa. A imersão no cotidiano do Cantão de Fribourg contribuiu sobremaneira em minhas pesquisas para entender o universo cultural dos primeiros colonos suíços que imigraram para o Brasil em princípios do século 19. A história da Suíça tem início na Antiguidade. Por volta de 500 a.C., as terras que hoje formam a Suíça eram ocupadas pelos réticos e os helvécios, ambas tribos celtas. Posteriormente, a Helvécia e a Récia foram incorporadas ao Império Romano. Porém, com o início da decadência desse império, em 401 d.C, os romanos abandonam sua província alpina. Mais adiante, essa região foi incorporada ao Sacro Império Romano-Germânico de Carlos Magno. Com o seu declínio, dinastias feudais como a dos Habsburgos lideram a região alpina. Diante da opressão feudal, em 1291, os camponeses livres de três cantões dessa região fazem uma aliança lutando contra o poder dos Habsburgos. Surgia nesse momento a Confederação Suíça. Os suíços ganharam notoriedade como soldados valorosos, sendo requisitados como mercenários em toda a Europa. Em razão disso, o papa Júlio II criou, em 1506, a Guarda Suíça para proteger o Vaticano. D. João VI, diante da reputação dos suíços como bons soldados, cooptou muitos deles para integrar sua força militar. No decorrer dos séculos, a confederação foi conseguindo a adesão de outros cantões. Os confederados conquistaram sua independência em 1499. O Cantão de Fribourg aderiu à Confederação Helvética em 1481. Atualmente, a Suíça conta com 26 cantões divididos quase igualitariamente entre católicos e protestantes. Uma constituição elaborada em 1848 transformou o que era uma vaga confederação de cantões numa união mais sólida regida pela Assembleia Federal, sendo Berna eleita capital da Suíça. 

No século 17, a Suíça possuía indústrias no setor têxtil e na fabricação de relógios cujos alicerces foram lançados por refugiados huguenotes da França. Os relógios suíços são um símbolo de precisão e confiabilidade. No século 19, inovações na mecânica de precisão permitiram que a fabricação de relógios fosse industrializada. A Suíça produz aproximadamente 95 milhões de relógios por ano. No século 19, igualmente despontam os chocolates de Alexandre Louis Cailler, Henri Nestlé e Philippe Suchard, e os famosos cubos de legumes e carne de Julius Maggi e  Carl Heinrich Knorr, que se tornaram marcas internacionais. A produção anual de queijo na Suíça é de mais de 150 mil toneladas e a maior parte é produzida pelas indústrias. No entanto, boa parte da fabricação de queijo ainda é feita nos chalets d’Alpage, os chalés do campo, que mantêm uma tradição milenar na sua confecção. País montanhoso, as terras aráveis são limitadas. Porém, os seus verdejantes campos alpinos têm uma grama especial que torna o leite extraído do gado leiteiro algo inigualável, influenciando no sabor do seu queijo e igualmente do chocolate. Quando pensamos na Suíça, imediatamente nos vem à mente uma imagem: as montanhas, os alpes. Cerca de dois terços do território da Suíça consistem em alpes e pré-alpes. Nos pré-alpes, com altitudes mais baixas, predominam as terras agrícolas e os pastos alpinos. Já nos alpes a paisagem é rochosa, com picos sempre nevados. Os alpes são cortados por vales, terraços, desfiladeiros e gargantas. No verão, os campos nos pré-alpes garantem boa pastagem para o gado. São desses pastos, como dito antes, que se produzem os fromages des alpes (queijos dos alpes), notadamente o gruyère e o vacherin. A paisagem com montanhas é uma característica da Suíça. Sem o mar, com pouca terra plana arável e uma temporada curta para a atividade agrícola, é do pastoreio nos verdejantes pastos dos pré-alpes, no verão, que os homens do campo tiram suas rendas. Teria Dom João VI instalado os colonos suíços na Região Serrana, tão imprópria ao cultivo, pois imaginava-os mais como pastores do que como plantadores de milho, feijão, mandioca e hortaliças? Entrando nesse universo dos fribourgoises, entendemos a intenção do rei: dar-lhes terras nas montanhas pois eram, na maioria, colonos pastores, e igualmente incrementar o povoamento do país. Talvez isso responda a algumas questões. 


Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora de diversos livros sobre a história de Nova Friburgo.  Curta no Facebook a página "História de Nova Friburgo”

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História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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