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O triunfo do palacete da Vila Amélia
O Ministério Público Estadual, por meio do Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente (Gaema), obteve na Justiça uma decisão liminar que obriga a Associação Friburguense de Amigos e Pais do Educando (Afape) e o município de Nova Friburgo a se absterem de destombar, destruir ou descaracterizar o palacete histórico da Vila Amélia, situado no bairro de mesmo nome. O processo tem como base o inquérito civil instaurado para apurar as condutas da Afape e da prefeitura passíveis de responsabilização por danos ao palacete, tombado provisoriamente por meio do decreto municipal 268, de 2012.
O Ministério Público reconhece o palacete como patrimônio de relevante valor histórico-cultural. Porém, mesmo com a proteção normativa, o histórico imóvel vem sendo negligenciado tanto pela Afape como pela Prefeitura de Nova Friburgo, sem qualquer conservação, sendo objeto de depredação e utilização por traficantes de entorpecentes em razão de seu abandono. O Ministério Público requer que a Justiça determine que os réus apresentem projeto de restauração e execução de obra no palacete. Solicitou ainda a recuperação integral do imóvel, preservando suas características originais, além de dar-lhe destinação útil, tendo como base a adequação à política local de fomento à preservação do patrimônio histórico e cultural da região.
Logo, dadas todas essas informações, depois da Justiça entra a história. Já escrevi em A VOZ DA SERRA inúmeros artigos sobre a importância histórica desse prédio, mas nunca é demais trazer novamente essas informações. O palacete da Vila Amélia foi construído pelo imigrante português Antônio Alves Pinto Martins, nascido em 1862, no Minho, em Portugal. Veio para o Rio de Janeiro com 11 anos de idade e trabalhou durante 40 anos no ramo do comércio. Casou-se com Carolina Gomes da Rocha e o casal teve oito filhos.
Em 1914, aos 52 anos, Antônio Martins teve um derrame e decidiu mudar-se com a família para Nova Friburgo, adquirindo no primeiro distrito uma chácara às margens do Córrego do Relógio. A única menina entre os seus oito filhos, Amélia, daria nome a chácara dos Martins, Vila Amélia. Instalou próximo a chácara um quiosque para a venda de leite, queijo, manteiga, verduras, legumes, frutas frescas e em conserva, mel, linguiças de porco por ele defumadas e o vinho que produzia.
A atividade econômica da chácara e a comercialização de seus produtos deu origem a atual feira que funciona no bairro Vila Amélia. Na chácara havia pomar com pereiras, macieiras, goiabeiras, canforeiras, jabuticabeiras, laranjeiras, caquis, tojos, bananeiras, pita e nêsperas. Na várzea plantavam-se hortaliças, legumes e aspargos. De um sobreiro, árvore que trouxe de Portugal, tirava a cortiça para fazer rolhas das garrafas do vinho que fabricava. Martins também trouxe de Portugal a árvore que florescia a flor de tojo, cujo pólen servia para o seu apiário. O mel que produzia ganhou uma premiação em Bruxelas, a Medalha Mel Flor de Tojo.
Martins construiu na chácara uma belíssima residência para a família, inaugurando o palacete no dia 18 de maio de 1916, conhecido na cidade como a mansão da Vila Amélia. Na frente da residência havia um lago com peixes e um belíssimo chafariz. Flores como rosas, margaridas, azaléas, orquídeas, palmeirinhas, cravos e boca de leão ornamentavam o seu entorno. Havia no interior da residência uma imponente escada de pinho de riga e na parede um vitral colorido, vindo da Europa, que ocupa toda a altura da casa.
As louças, jarros d’água, bacias e saboneteiras eram em faiança portuguesa e tinham o monograma AM, de Antônio Martins, assim como as toalhas, os guardanapos e as roupas de cama. O Córrego do Relógio era circundado por videiras plantadas por Martins que se entrelaçavam sobre uma pérgula de ferro. Era uma atração turística na cidade. Antônio Alves Pinto Martins faleceu no dia 25 de junho de 1924, com 62 anos, em sua residência na Vila Amélia. Já a matriarca da família faleceu em 1945, com 82 anos de idade.
A partilha do palacete e da chácara entre os muitos herdeiros foi bem litigiosa até que passou a ser de propriedade da Afape. Oxalá tivéssemos, no passado, uma intervenção como essa do Ministério Público e não teríamos perdido a Casa de Madame Santana, a Casa de Dona Vitalina e a propriedade dos Salusse, conhecida como a Casa de Rui Barbosa.
Janaína Botelho
História e Memória
A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.
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