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O Centro Fluminense: Uma paisagem agreste
No estado do Rio de Janeiro, a mesorregião do Centro Fluminense é formada por dezesseis municípios como Nova Friburgo, Cantagalo, Cordeiro, Duas Barras, Santa Maria Madalena, Carmo, Macuco, Bom Jardim, Sumidouro, São Sebastião do Alto, Trajano de Moraes, Sapucaia, Três Rios, Areal, Paraíba do Sul e Comendador Levy Gasparian. Esses municípios pertenciam no passado a uma região conhecida por Sertões do Macacu e que posteriormente formaram a Magna Cantagalo. Foi para essa região que se dirigiram fazendeiros de Minas Gerais e portugueses da Ilha da Madeira e dos Açores para explorar o ouro de aluvião depositado nos afluentes dos rios Grande e Negro. Esses rios, depois de se unirem e percorrerem um longo trajeto, irão desaguar no Rio Paraíba do Sul. Esse majestoso rio percorre os estados de São Paulo (13.900 km²), Rio de Janeiro (20.900 km²) e Minas Gerais (20.700 km²), uma das regiões mais industrializadas e politicamente importantes do país.
Quando esses pioneiros chegaram nos Sertões do Macacu tudo era vegetação de Mata Atlântica. A história ambiental no Vale do Paraíba do Sul inicia com o etnocídio e desterritorialização dos índios Puri e Coroado que ali habitavam. Verificando que as Novas Minas de Cantagalo não tinham o ouro de aluvião que se projetara, o falso Eldorado desilude muitos proprietários de terras que abandonam a região. Os que permanecem plantam cana-de-açúcar, milho, feijão, criam pequenos animais e surgem engenhos de açúcar. Não se pode falar ainda em uma criação de gado bovino a nível comercial, pois o gado europeu trazido pelos portugueses era fraco. Teremos que aguardar que Manoel Lemgruber, descendente de colonos suíços, importasse em 1878, da Alemanha, a raça indiana zebu para melhorar o gado nacional e colocá-lo em escala comercial. A partir da terceira década do século 19, a cultura do café coloca essa região como uma das mais importantes do Brasil durante o Segundo Reinado.
Nessa ocasião, o café é o mais importante produto de exportação do país, superando do açúcar do período colonial. Chegou-se a dizer que o “Brasil é o Vale”, numa alusão ao Vale do Paraíba do Sul. Para o plantio dos cafezais, a Mata Atlântica foi totalmente derrubada e queimada resultando em danos ambientais irreversíveis, mormente com a diminuição das chuvas. Na maior parte da região do Vale do Paraíba o clima predominante é o subtropical quente com verões chuvosos e invernos secos. O ciclo econômico do café durou até que a terra exaurida diminuiu a produtividade dos cafezais, provocando a falência dos fazendeiros. Extraídos os pés de café veio a erosão dos morros com o consequente assoreamento do Rio Paraíba do Sul. Muitas fazendas falidas foram arrematadas em leilão por descendentes de colonos suíços. No entanto, mudaram gradativamente a atividade econômica para pastagens extensivas, com a criação do gado leiteiro e de corte, graças ao empreendedorismo de Manoel Lemgruber que melhorou o gado bovino. Somente os municípios de Bom Jardim e de Duas Barras mantiveram o cultivo de café e isso em razão de uma única família, os Erthal, descendentes de colonos alemães.
Os morros, que perderam a cobertura florestal para dar lugar aos pés de café, estão sulcados por erosão e sendo constantemente pisoteados pelo gado. Em todo o Vale do Paraíba, o desflorestamento reduziu a cobertura florestal natural de 82% da área original para cerca de 5%. Ao se avistar nos morros dos municípios do centro fluminense algumas coberturas de vegetação, depara-se com a reconstituição da mata, e não com o bioma original. Provoca pavor percorrer essa região. Em algumas localidades, a paisagem lembra o agreste nordestino. Quando estive no Ceasa de Ponto de Pergunta, perguntei a alguns agricultores familiares sobre a questão das chuvas. Todos afirmaram que vêm reduzindo nos últimos anos, diminuindo produção agrícola local. O ciclo econômico do café deixou duas consequências negativas, o adiamento do fim do trabalho escravo e a destruição de praticamente todo o bioma da Mata Atlântica no Vale do Paraíba. Fica neste artigo um exemplo histórico da importância do desenvolvimento sustentável.
Janaína Botelho
História e Memória
A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.
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