Mão de Luva na novela da Rede Globo

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Cantagalo está em festa e nós em Nova Friburgo, igualmente, deveremos estar. Na novela da Rede Globo, “Liberdade, Liberdade” uma personagem da história de nossa região, o Mão de Luva, foi contemplada no roteiro do primeiro capítulo. Haja coração para os cantagalenses! Mas quem foi Mão de Luva? A história do Mão de Luva está diretamente relacionada com a formação do município de Cantagalo. Tudo se inicia no último quartel do século 18, quando um bando de garimpeiros chefiados por Mão de Luva se desloca da província de Minas Gerais para os Sertões do Macacu, região que compreende todo o Centro-Norte Fluminense. Diz-se sertões, pois era o interior do termo(município) de Santo Antônio de Sá(Itaboraí e outros municípios) e Macacu era o rio que banhava o termo. Nossa região pertencia a Santo Antônio de Sá. Mão de Luva descobriu lavras de ouro nesses sertões nos rios Macuco, Negro e Grande e faiscava clandestinamente com o seu bando.

Uma versão atribuiu a Mão de Luva uma descendência aristocrática lusa. Nos fins do reinado de D. José I, Rei de Portugal, Manuel Henriques, duque de Santo Tirso, possuidor de vastos domínios e grande riqueza, cavalheiro erudito e de denodada simpatia, apaixonara-se pela filha do monarca, Maria de Bragança, que mais tarde seria elevada ao trono com o título de D. Maria I. Conheceram-se numa recepção realizada na Corte e ambos apaixonaram-se trocando juras eternas de amor. Certa feita, o duque recebeu em seu castelo, no Porto, uma carta convidando-o a participar de uma conspiração contra o poderoso Marquês de Pombal e forçar a abdicação de D. José I, em favor de sua filha. A ardilosa princesa prometera sua mão ao enamorado duque caso a conspiração triunfasse. O duque imediatamente aderiu à causa e partiu para Lisboa levando homens e recursos financeiros. No entanto, o Marquês de Pombal abortou a conspiração e promoveu uma devassa contra todos os conspiradores. O duque de Santo Tirso foi condenado ao degredo perpétuo no Brasil, sendo-lhe confiscados todos os bens, cassados os títulos de nobreza e considerado infame até a terceira geração. Na véspera do seu embarque para o degredo ao Brasil, a princesa Maria de Bragança, cobrindo o rosto em negro véu, visitou-o no calabouço exclamando: “...ides para o país da minas de ouro, das pedras preciosas. É possível que dentro em breve, possais reunir fortuna capaz de comprar a vossa liberdade e então, regressareis à Pátria (...) Antes desse dia, entretanto, vossa mão direita, que ora tenho apertada entre as minhas, não deverá tocar em as de outra pessoa. Usareis na destra, uma luva preta, esta aqui que vos entrego. Só deixareis de calçar[a luva], no dia em que a despires para colocá-la na mão da Rainha de Portugal, vossa esposa.” O duque de Santo Tirso partiu para o degredo no Brasil e se tornou um garimpeiro contrabandista, perseguido pela Coroa por fraudar o fisco. Partindo de Minas Gerais, onde a exploração de ouro e diamantes campeava, embrenhou-se nos Sertões do Macacu, explorando o ouro nos rios da região sem pagar o quinto, o imposto devido à Coroa Portuguesa. O vice-rei Luiz de Vasconcelos e Souza mandou uma expedição aos Sertões do Macacu, até então somente habitada por índios, para prender o bando de Mão de Luva. O bando foi preso, julgado e deportado para a África. D. Maria I é a mãe de D. João VI e faleceu insana no Rio de Janeiro com 82 anos de idade.

Segundo o pesquisador Clélio Erthal, parte dessa versão é pura lenda. Admite que existisse o contrabandista Manoel Henriques, mas não era nobre, pois não consta da nobiliarquia lusa nenhum duque com esse nome. Mão de Luva era um mulato ativo e atrevido que entrou em muitas desordens e numa delas perdeu uma das mãos que substituiu por uma luva de couro. Era um líder que comandou a invasão dos Sertões do Macacu, um condottiere, que sabia aliar à força bruta, finos golpes de inteligência. Insinuante, não lhe faltava habilidade para envolver e subornar autoridades e nem energia para se impor aos comandados, para quem sua palavra era lei. Quem nos dá essa informação sobre ele é o mineralogista alemão Ludwig Wilhelm Von Eschwege, no século 19. Provavelmente essa atribuição de nobreza a Mão de Luva partiu de quem não quis atribuir ao desbravador de Cantagalo a etnia negra, já que se tornara uma figura heroica. Foi graças a ele que os Sertões do Macacu ganharam autonomia e se desmembraram de Santo Antônio de Sá, surgindo Cantagalo e alguns anos depois, Nova Friburgo.   

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    Mão de Luva descobriu lavras de ouro nos Sertões do Macacu e faiscava clandestinamente com o seu bando

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    Mão de Luva era um mulato atrevido que entrou em muitas desordens e numa delas perdeu uma das mãos que substituiu por uma luva de couro

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    Mão de Luva retratado na novela Liberdade, Liberdade, da Rede Globo. O roteirista optou pela lenda, pois Mão de Luva era um mulato faiscador

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Janaína Botelho

Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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