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Mamãe eu quero, mamãe eu quero outro carnaval
Neste artigo gostaria de fazer algumas reflexões sobre o último carnaval. Esse evento passa por transformações ao longo do tempo, ninguém o nega. No entanto, devemos estar atentos a certas influências nocivas às tradições culturais. Refiro-me ao funk. Muitas foram as reclamações dos foliões em Nova Friburgo em relação aos blocos de embalo, que ao invés de executar as tradicionais marchinhas e músicas de carnaval, tocaram funk.
Segundo informações, esse é um fenômeno nacional e não inerente a Nova Friburgo. Mas entre os foliões friburguenses, não agradou a introdução desse gênero musical nos folguedos de carnaval. Submeter os foliões ao ritmo do funk justamente quando a participação em blocos de embalo tem crescido a cada ano é crueldade. A preferência em desfilar nesses blocos tem ocorrido em razão das escolas de samba darem pouca margem ao sambista para dançar livremente.
As escolas de samba têm imprimido uma evolução militar, muito cadenciada, que pode ficar interessante para quem assiste, mas, no entanto, não dá flexibilidade ao passista de brincar quando desfila na escola. Voltando a questão do funk, deveria haver por parte da Secretaria Municipal de Cultura, guardiã de nossas tradições, proibição na execução de outros gêneros musicais, e notadamente do funk, privilegiando as marchinhas e o samba nos dias de carnaval.
Não se trata aqui de fazer apologia à censura. Que essas músicas não carnavalescas tenham o seu espaço em todo o resto do ano, mas não ocupem o lugar de nossas deliciosas marchinhas que vem embalando gerações durante décadas nos carnavais. Outra coisa que não dá para entender são as bandas contratadas pelo governo municipal tocarem tudo, menos músicas carnavalescas. Seria o caso da Secretaria de Turismo e Cultura exigir a execução de um repertório ligado ao carnaval nos shows em que é provedora.
E já que o assunto são as tradições culturais o mesmo problema ocorre com a festa de São João. Infelizmente não vemos mais na festa do padroeiro da cidade um arraial de barraquinhas com bambus e bandeirinhas de tecido ou papel dando um colorido à festa, a simulação da fogueira e guloseimas privilegiando o milho, base da culinária junina. A Igreja Católica deveria zelar pela manutenção de elementos que lhes são característicos.
Mas apesar de tudo, o carnaval em Nova Friburgo foi só alegria. As escolas de samba e os blocos deram um show em criatividade abordando quase todas, nos carros e alegorias, um tema da história de Nova Friburgo em razão da celebração nesse ano do bicentenário. Isso me fez refletir que esse ano poderíamos ter um segundo carnaval no desfile de 16 de maio, aproveitando boa parte desse material para reapresentar a história do município.
Afinal, ter dois carnavais em um ano já aconteceu na história do Brasil. Em fevereiro de 1912, a cidade do Rio de Janeiro era a capital federal sendo o presidente da recente república o marechal Hermes da Fonseca. Às vésperas do carnaval falece o barão do Rio Branco, ministro das Relações Exteriores, que gozava de grande prestígio no cenário político nacional. Como conciliar o carnaval velando o Barão do Rio Branco?
O marechal Hermes da Fonseca, então, entendendo que não haveria clima transferiu, por decreto, o carnaval para o mês de abril, não dando apoio financeiro e logístico para evitar esse folguedo no mês de fevereiro. Porém, o centro do Rio de Janeiro foi tomado pelos foliões na semana que seria o carnaval, mesmo sem o apoio do governo federal. No entanto, como já havia sido decretado que o carnaval oficial era no mês de abril, os foliões festejaram novamente nesse mês e o país teve outro carnaval. E criaram a marchinha, “com a morte do barão, tivemos dois carnavá. Ai que bom, ai que gostoso, se morresse o marechá.”
Janaína Botelho
História e Memória
A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.
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