É Natal...em Nova Friburgo...no final do século XIX

sábado, 31 de julho de 2010

Como era o Natal em Nova Friburgo no final do século XIX? Foi graças ao saudosismo de Henrique Zamith, que viveu a sua infância e juventude na Friburgo fin-de-siècle, que hoje podemos conhecer o cotidiano, no Natal, de uma típica família friburguense oitocentista daquela época. Sua crônica evoca um passado onde havia ainda os resquícios da escravidão, há pouco extinta, onde a cozinha era comandada pelas outrora negras cativas.

Em Friburgo, hoje temos os bailes, a exemplo do rock’ noel, onde muitos adolescentes terminam a noite depois da ceia com a família. Na Friburgo do século XIX, alguns músicos percorriam as ruas tocando instrumentos, pois boa parte da população ia para a praça flanar na noite de Natal. Segue um trecho de uma deliciosa crônica que nos remete à ceia de Natal, ao movimento da casa, do sarrabulho, sangue coagulado do porco para fazer o chouriço, onde as crianças tagarelavam talvez excitadas pelo cheiro do sangue dos animais abatidos, que nos remete a hecatombe dos rituais gregos. Hoje, felizmente, os adquirimos congelados, o que nos poupa desta cena lamentável em relação aos animais. Mas não devemos julgar os costumes de nossos antepassados, pois os tempos eram outros. Penetremos então nesta deliciosa narrativa, que abre uma janela para o passado.

“A chegada do Natal, momento íntimo e familiar era dia de grande sarrabulhada. As casas ficavam todas em polvorosa: da sala de visitas à cozinha, o quintal, a dispensa, a copa, era uma azáfama de endoidecer. As crias da casa, velhas negras remanescentes da extinta escravidão resmungavam, arrumavam, iam e vinham, taramelavam, lavavam, vasculhavam, areavam e poliam. Na despensa, era um requebrar de ovos, bater de bolos, o lambuzar de forminhas, o fazer de doces, pudins, biscoitos e broas. Na cozinha, o preparo de perus, leitoas, frangos recheados e tortas, mal dava tempo de descanso às velhas cozinheiras. As próprias costureiras não tinham mão a medir: damas, senhoritas e meninas todas tinham seus vestidos encomendados. Enfim, chegava a véspera do Natal! Era um dia de prazer, de vivas emoções, de júbilo e de alegria! Os jantares desse dia eram notáveis! Vinham as cantigas e depois o sarau respeitoso até às dez horas com as valsas lentas. Na ceia, castanhas, rabanadas, leitoas, frangos, perus, doces, amêndoas e vinho verde. A tradicional missa do Galo, onde de tudo se cogitava menos ouvir a missa e depois os boas-noites, boas-festas e muitas felicidades. A seguir, todos se recolhiam contentes e felizes, e a meninada a sonhar com o papai Noel a lhe encher de brinquedos as botinas e os sapatos.....” A todos os leitores e equipe de A VOZ DA SERRA, um FELIZ NATAL!

Texto extraído da crônica de O Friburguense, matéria De Antigamente e de Agora, de 23/12/1928. Fonte:Centro de Documentação Pró-Memória de N.F. Visite o site www.djoaovi.com.br.

Janaína Botelho é professora de História do Direito da Candido Mendes, pesquisadora e autora do livro O Cotidiano de Nova Friburgo no Final do Século XIX. mjbotelho@globo.com

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História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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