Colonização e imigração: como contar a sua história? - Ultima parte

quarta-feira, 09 de julho de 2014

Os espanhóis foram os grandes construtores em Nova Friburgo. Uma das primeiras famílias que chegou foi a de Vicente Sobrinho, dedicando-se à construção de telhas, tijolos e cerâmica, adquirindo uma olaria da família do barão de Nova Friburgo. Francisco Vidal Gomes foi o responsável pela construção dos principais edifícios históricos, a exemplo do CNS das Dores, outrora Hotel Central, e do Colégio Anchieta. Outros se dedicaram ao comércio de alimentos: a família Estebanez, em 1889, possuía uma fábrica de doces e Ruiz Boler foi um dos primeiros a fabricar sorvete artesanal. Não vieram de uma única região, mas de várias como Málaga, Palma de Maiorca e Galícia.   

Já os árabes foram igualmente importantes partícipes da sociedade friburguense. Sua chegada a Nova Friburgo remonta ao final do século 19. Como os árabes viviam sob o domínio Turco-Otomano, os passaportes eram expedidos por esse governo e assim o vulgo os chamava de "turcos” — e, desde então, a confusão entre turcos e árabes é frequente. Mascatear foi a profissão exercida pela maior parte dos árabes, que, décadas depois, se sedentarizaram, alguns abrindo comércio de tecidos no centro da cidade. Em julho de 1919, criaram o Centro Líbano-Friburguense no intuito de irmanar todos os conterrâneos, prestar auxílio mútuo e promover a sociabilidade. Na década de 30 do século 20, criaram o clube esportivo Clube Sírio e Libanês. Mas os árabes não se limitaram a Nova Friburgo. Em princípios do século 20, como o Centro-Norte fluminense gozava de prosperidade, muitos deles se dirigiram para essa região. Imigraram em número significativo para Cantagalo, Trajano de Moraes e Itaocara famílias de negociantes árabes. Como mascates, se dirigiram para onde a economia era próspera, já que o seu trabalho facilitava a mobilidade. Atualmente, com aproximadamente duzentas famílias, duas delas muçulmanas e o restante cristãs, realizam esporadicamente missas maronitas a fim de manter uma tradição cultural. Alguns sobrenomes foram abrasileirados devido a uma corruptela por ocasião do registro civil. Procurando se reestruturar, criaram a Associação Cultural Líbano-Friburguense em 2013. Não tendo sede própria, dependem da Praça das Colônias para manter e divulgar suas tradições culturais. Finalmente, os suíços. Chegaram em princípios do século 19 para fundar uma colônia na fazenda do Morro Queimado, em Cantagalo. O rei D. João VI criou um termo — vila — para desvincular a administração da colônia de Cantagalo: surge Nova Friburgo. Os suíços receberam terras impróprias ao cultivo, o que não se entende até hoje. Talvez o objetivo fosse apenas o povoamento com pessoas brancas, já que a Corte se chocou com o grande número de africanos no Rio de Janeiro, excedendo o de brancos. Ou ainda para atender a uma pressão inglesa de que Portugal tinha projetos de extinguir a escravidão, substituindo a mão de obra cativa pela livre. Os suíços abandonaram consequentemente o núcleo colonial e se dirigiram para Cantagalo, tornando-se, em sua maioria, prósperos fazendeiros. Os que continuaram em Nova Friburgo se concentraram em Lumiar e São Pedro, isso porque D. Pedro I concedeu-lhes autorização de deixar o Núcleo Colonial e ocupar as terras de Macaé de Cima. Os suíços permaneceram por décadas uma comunidade insular, isolada, em Nova Friburgo. Na década de 70 do século 20, passaram a ganhar visibilidade graças ao carismático suíço Martin Nicoulin, que fazia uma pesquisa sobre a colonização suíça na cidade. Sua tese de doutorado deu autoestima aos descendentes de colonos suíços e seu trabalho redundou igualmente na criação do Instituto Fribourg-Nova Friburgo, estabelecendo elo permanente entre a Suíça e o município.

É possível cada "colônia” contar a sua história em Nova Friburgo? Infelizmente, algumas dessas instituições mal sabem contar a sua história na cidade. Os suíços, abrigados pelo Instituto Fribourg-Nova Friburgo, deram um passo a frente. Possuem um memorial, a Casa Suíça e as memórias familiares registradas em algumas obras. De acordo com as quase dez horas de entrevistas realizadas, percebe-se que as associações de descendentes de colonos e imigrantes sentem-se desamparadas, quer pelo poder público, quer por seus próprios pares. A renovação dos representantes dessas entidades é incerta. O desinteresse das novas gerações é patente. Quase todos encontram dificuldades no processo interno de preservação das tradições culturais, de sua história e de sua memória.  

 

Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora de

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História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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