A independência do Brasil em Nova Friburgo

quinta-feira, 06 de setembro de 2012

A independência do Brasil de Portugal é celebrada no dia 7 de setembro com o forjado grito do Ipiranga, “independência ou morte”, uma alegoria de afirmação da independência do Brasil da Metrópole. A oficialização da separação veio com a aclamação de D. Pedro I como imperador constitucional do Brasil em 12 de outubro, dia de aniversário do soberano, seguida pela sua coroação em 10 de dezembro. Mas como foi recebida a notícia da independência do Brasil na recém-criada vila de Nova Friburgo? A notícia foi registrada em ata na Câmara Municipal em reunião realizada 3 de outubro de 1822, o qual foi lido o ofício da Câmara do Rio de Janeiro, datado de 17 de setembro. Vereadores, o comandante militar, o diretor da Colônia dos Suíços, a tropa de primeira linha, e igualmente o “clero, a nobreza e o povo” aclamaram o Imperador D. Pedro I. O povo da vila de Nova Friburgo levaria ao conhecimento de Sua Majestade Imperial os fiéis votos de que estariam resolutos a dar a vida pela defesa da sua independência, igualmente felicitando-o pela sua elevação ao trono. Foram enviados representantes da vila à Corte na data da aclamação e igualmente na coroação: Nova Friburgo queria ser lembrada. Afinal, um ano depois da fundação da colônia, o seu idealizar, D. João VI, muito a contragosto foi obrigado a partir para Portugal, em virtude da pressão dos reinóis. A colônia ficou acéfala.

As celebrações principiaram no dia onze de outubro e se estenderam por quatro dias. A música, a iluminação, a pólvora para as descargas e todas as demais despesas foram pagas pelos vereadores de seus próprios bolsos. Depois dos ritos religiosos invocando a assistência do Divino Espírito Santo vieram os “vivas” e as “descargas” de alegria, sendo proferido o seguinte discurso na ocasião: “A Providência, árbitra das nações, árbitra suprema dos destinos das nações, parece, há séculos, particularmente desvelada em vigiar esta porção formosa do globo, o vasto, rico e abundantíssimo Império do Brasil, para elevá-lo, por meios que escapam à percepção humana aquele grau de preponderância e majestade com que deve figurar entre as nações cultas e poderosas do universo. Foi ela quem fez ressurgir das entranhas do oceano este destacado continente e o ofereceu às vistas do venturoso Cabral a fim de que a civilização, a arte e a ciência, que um dia haviam de abandonar a caduca Europa, viesse colocar aqui a seu trono, a brutalidade de povos incultos e errantes e sucedesse uma nação humana, generosa e liberal, qual hoje nós conhecemos. Ela que elevou ao trono da França o inimigo da tranquilidade dos Estados fez com que D. João VI, afrontando os perigos de tão longa e arriscada viagem, transportasse, do velho para o novo mundo a sede da monarquia e viesse quebrar os ferros dos nossos portos e lançasse a grande carta da nossa emancipação e pusesse, dessa forma, limites ao sistema colonial com que sua política bárbara e degradante nos oprimiam. Foi ela que nos feriu com o terrível golpe da retirada deste Augusto monarca cuja memória saudosa será indelével em nossos corações para dissipar o véu da nefanda antiga com que homens ambiciosos e inimigos da pátria, que tão generosamente os nutre, conspirassem contra a nossa liberdade e nos pregavam cadeias mais pesadas, talvez mais do que aquelas que, por tantos anos tínhamos arrastado. Foi ela, enfim, que levou o filho primogênito e Augusto daquele grande monarca a nos dar esta tábua da nossa salvação, a inabalável coluna que sustenta o edifício político deste Império e tomar, sobre si, em circunstâncias tão melindrosas, apesar do encargo de perpétuo defensor de nossos direitos. Quem tão cego ou tão ímpio que desconheça em tudo isto a poderosa e sábia mão da providência? Sim, senhores, o brado que no dia 24 de agosto soou nas margens do Douro correu dali pelo resto de Portugal foi repetido desde o Amazonas até o Prata com entusiasmo prazeroso, com uma velocidade incrível os povos, mais ou menos vexados pelos abusos que através do tempo tinham sido introduzidos na marcha a administração pública pela própria decrepitude de leis feitas em tempos muito remotos que não podiam mais ser eficazes e adaptadas ao estado atual das coisas, se tinham, em toda a sua extensão, a necessidade de uma reforma e que, sem ela, a mão do Estado corria o grande risco de perder-se. Este sentimento profundamente gravado no coração de todos havia predisposto para uma nova ordem de coisas.

A notícia dos acontecimentos em Portugal e Brasil correu cegamente a abraçar a sua causa sem que o excesso do prazer e o fogo veemente muitas vezes fatal do entusiasmo, lhe deixasse liberação para examinar a legitimidade e ponderar com madureza as consequências felizes ou funestas que dali podiam derivar. Estas razões, senhores, eram bastante para nos medirmos; contudo não foram as únicas. Portugal prometeu uma reforma prudentemente liberadas em cartas, prometeu uma constituição livre afiançando a igualdade de representação, tratou-nos com expressões de verdadeiro amor e fraternidade, porém, qual foi o nosso espanto quando, em vez daquelas reformas, nos derrubam, até os alicerces, os elementos do Estado, e levanta sobre as pedras da monarquia lusitana uma completa democracia quando sendo tão diferente as nossas circunstâncias, que querem nos obrigar à inteira submissão modelada pela da Espanha, de cujas bases é tanto mais duvidosa a bondade quanto mais repetidas, desastrosas e encarniçadas, à disposições que afligem aquele país, quando vemos no congresso um partido dominante só oferecer as razões e frustrar as diligências dos mais dignos dos nossos mandatários, ameaçados e escarnecidos pela vil plebe das galerias com escândalo de que apenas se poderia achar exemplo entre nações bárbaras da África vizinha quando vimos projetavam derrubar o Brasil do grau da sua dignidade a insultar a carta da sua emancipação, desligá-lo do Sistema Continental Americano, negar-lhe um centro comum, exaurir o seu tesouro, tornar divergentes as suas Províncias, sujeitá-las ao despotismo de chefes militares, obstar os meios de sua defesa e, para coroa de tudo isto, restabelecer o monopólio do comércio, quando vimos receberem com todo brio a justa reclamação de nossos atropelados direitos mandarem processar os governos que tomaram a peito os interesses do seu povo.(...) Se Portugal recebia com rancor as reclamações dos nossos direitos com mais rancor ainda repelíamos os ferros que eles nos preparavam, e tendo por último jurado a nossa escravidão era forçoso que jurássemos também perante o Céu e as Nações defender por toda a vida a nossa Independência. Nós a fizemos e ganhamos certamente com este passo o afeto das Nações briosas e imparciais. (...) Lancemos mão do último recurso que a Política nos oferece: Acabemos da salvar a Pátria, unamos, enfim, as nossas vozes às de todo o Brasil que certamente neste momento exclama no maior transporte de entusiasmo da alegria viva da nossa Santa Religião. Viva a Independência do Brasil; Viva a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Brasil; Viva o Imperador Constitucional do Brasil, o Senhor Dom Pedro Primeiro. Viva a Imperatriz do Brasil e a Dinastia de Bragança, imperante no Brasil.”

Janaína Botelho é professora de

História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora do livro “História e Memória de Nova Friburgo”. historianovafriburgo@gmail.com

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Janaína Botelho

Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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