A Gênese de Nova Friburgo

quinta-feira, 08 de maio de 2014

Nova Friburgo foi a primeira experiência na história brasileira de incentivo à vinda de colonos não portugueses ao Brasil. Na realidade, a verdadeira política de incentivo à imigração viria apenas no último quartel do século XIX; não obstante, durante esse século, iniciativas particulares tinham sido encetadas por fazendeiros através de agências privadas. Os suíços chegaram ao Brasil em fins de 1819, e parte do termo de Cantagalo foi desmembrado para dar origem a Nova Friburgo. A evasão dos colonos suíços do Núcleo Colonial ocorre em razão da má qualidade das terras distribuídas. Ao final do século XIX, Nova Friburgo recebe uma significativa parcela de imigrantes italianos e portugueses e, em menor quantidade, espanhóis e árabes. Em função das indústrias instaladas por empresários alemães em 1911, Nova Friburgo se torna atrativa aos germanos e muitos deles estabelecem domicílio nesse município. Até o terceiro quartel do século XX, se destacam em Nova Friburgo os alemães, os italianos, os portugueses e árabes libaneses como empresários no ramo industrial e do comércio, e igualmente nas atividades sociais. E como ficaram os suíços que deram a largada inicial nessa torre de babel serrana? Os que migraram para Cantagalo se tornaram prósperos ou morigerados fazendeiros. Mas os suíços que permaneceram em Nova Friburgo ficaram na condição social de modestos agricultores, próximo ao caboclo nacional, se concentrando em Lumiar, São Pedro da Serra, Vargem Alta e Amparo. Formaram uma comunidade insular dentro de Nova Friburgo, durante décadas. No entanto, um único homem mudaria essa história. Um homem e sua obra. Martin Nicoulin mudou a trajetória dos descendentes de suíços quando escreveu o livro "A Gênese de Nova Friburgo”. Foi com a sua obra e com o seu carisma que conquistou Nova Friburgo. 

Seu livro trata especificamente do período em que as famílias suíças são cooptadas nos Cantões da Confederação Helvética (Suíça) para trabalhar como colonos no Brasil. Narra igualmente a trajetória marítima dos colonos, o seu cotidiano até a chegada à Fazenda do Morro Queimado, uma das sesmarias que viria compor Nova Friburgo. Nicoulin fez a sua pesquisa nos anos 70 do século XX, e se orgulha de ter conseguido resgatar todos os sobrenomes das famílias suíças. Sua pesquisa deu autoestima a uma classe média de descendentes de colonos suíços que começou, a partir de então, a escrever biografias de histórias familiares e a organizar encontras anuais. E não parou por aí. O maior fruto da obra de Nicoulin foi a origem do Instituto Fribourg-Nova Friburgo, estabelecendo vínculos permanentes entre a Suíça e o município. Em 1977, veio um grupo de suíços a Nova Friburgo e essa visita resultou na criação desse instituto, objetivando promover ações culturais. Iniciou suas atividades estimulando uma tradição suíça: a fabricação de queijo. Para tanto, construiu e implantou a Queijaria-Escola, inaugurada em 1º de agosto de 1987, Dia Nacional da Suíça. O Instituto Fribourg-Nova Friburgo enviou queijeiros profissionais da Suíça para a outrora colônia para dar formação profissional em um modelo similar ao desse país. Na Suíça, para se tornar um mestre queijeiro, leva-se três anos. Infelizmente, a escola não foi adiante, tendo sido arrendada a uma empresa privada. O instituto instalou igualmente a Chocolataria, uma escola para ensinar a fazer chocolates artesanais, outra tradição suíça. No entanto, a qualidade do queijo gruyère de Nova Friburgo não se assemelha aos produzidos em Gruyères, Fribourg, Neuchatel, Vaud, Jura e alguns distritos de Berna em razão de uma particularidade: o tipo de grama consumida pela vaca nos campos da Suíça tem uma floração que dá todo o diferencial ao queijo. E daí os chocolates suíços serem os melhores do mundo, igualmente em decorrência do leite, e não do cacau.

No mesmo local, foi criada a Casa Suíça, inaugurada em 1º de agosto de 1996, um memorial da colonização que mostra utensílios e objetos dos suíços quando de sua chegada ao Brasil. Todo esse intercâmbio tem origem no trabalho de Martin Nicoulin. Não fosse ele, a memória dos suíços não teria o destaque que teve na história local. Chegaram mesmo a sobrepor-se sobre as outras colônias que tinham anteriormente mais destaque nas atividades sociais de Nova Friburgo. A história dos colonos suíços ganhou mais visibilidade e circularidade. "A Gênese de Nova Friburgo” é o exemplo de que um livro pode provocar uma grande transformação. E provocou!


Janaína Botelho é professora de História do Direito na Universidade Candido Mendes e autora de

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Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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