Leitores - 30/11/2013

sábado, 30 de novembro de 2013
Mensagens pela internet sem identificação completa e textos digitados com todas as letras maiúsculas serão desconsiderados para publicação. Em razão do espaço, os textos podem ser resumidos ou editados. O jornal também se reserva o direito de publicar ou não as cartas dos leitores.   Ponto de Vista 1 Gostaria de agradecer ao historiador Rodrigo Marreto pela contribuição histórica que vem dando para evolução esse município, pesquisando a fundo e desmistificando essa ideia imposta há anos pela classe média, de "clareamento e sangue azul do nosso povo”, que há décadas é feita por nossos governantes, junto com os meios de comunicação local e não nos favorece em nada. Rodrigo, o meu muito obrigado! Jansen S. Dimas Ponto de Vista 2 O autor da coluna "Ponto de Vista” de AVS da semana passada, aluno do curso de Mestrado de História da UFF, nos traz informações importantes sobre aspectos ainda não muito conhecidos da colonização suíça em Nova Friburgo. É um tema que deveria fazer parte do currículo escolar do ensino médio, nas escolas do Município, para que as novas gerações conhecessem alguns episódios pouco explorados historicamente, por exemplo, a participação efetiva dos escravos negros na fundação de nossa cidade e, quem sabe, de outras etnias. O mestrando Rodrigo Marreto procura mostrar que a nossa colonização não está limitada e nem se iniciou, a rigor, com a vinda dos suíços. Supõe-se que a Fazenda do Morro Queimado, onde se instalaram, inicialmente, as famílias suíças (aliás, a minha família está aí incluída: a família Murith — hoje Mury — que exportou 36 pessoas, entre crianças e adultos) já abrigava famílias de escravos negros para trabalhar para os senhores donos das lavouras de café, milho etc. Permita-me o ilustre mestrando discordar de uma expressão usada no seu texto: "A colonização suíça... como mito fundador de nossa cidade”. Em verdade, os suíços foram, sim, os fundadores da cidade, pois eles vieram para cá autorizados a entrar no País como colonizadores, por Decreto Imperial de D. João VI. O que se pode analisar, e isto daria certamente outra pesquisa, é quanto ao relacionamento vivenciado dos suíços recém-chegados com os "nativos” da época, cuja população, talvez, teria sido constituída por outros componentes. Creio que os índios fizessem parte desse contingente de pessoas já existentes nesse território brasileiro. A denominação desse novo território — Nova Friburgo —, só passou a vigorar a partir da colonização suíça, pela semelhança de clima, topografia etc., com o Cantão Fribourg da Suíça. Daí a alcunha de "Suíça Brasileira”. Mas, com o tempo, ela foi se descaracterizando. Mas, aí, é outra história... E merecedora de outros estudos sociológicos. Aécio Mury da Costa Ponto de Vista 3 O tema da escravidão negra tem sido muito discutido nos últimos anos. Também vem crescendo a preocupação com o papel (ativo) ocupado pelos escravos na sociedade colonial e pós-colonial. Seus autores mostram que as visões dualistas, nas quais o escravo aparece ora como "herói”, ora como "coisa” são, senão equivocadas, ao menos insuficientes. Eles ensaiam novos olhares sobre a escravidão — olhares "desde dentro”, olhares "desde baixo” —, buscando reconstruir a imagem e a vida de um sujeito escravo mais real, ao abandonar visões idílicas ou radicalistas. Com respeito à história de Nova Friburgo, existem vários trabalhos sobre a criação da colônia suíça, sua extinção e a posterior história do município. Mas só recentemente tem-se pesquisado com profundidade a presença de escravos na então Villa de Nova Friburgo. Os estudos mais antigos nem sequer citam a presença deles na região, atendo-se principalmente à vinda dos colonos suíços e alemães, ou a sua saga ao embarcarem em suas terras rumo ao desconhecido. A maioria desses trabalhos também desprezava a presença prévia de portugueses na localidade conhecida como Fazenda do Morro Queimado. E também a falta de autonomia dos colonos suíços — e, posteriormente, dos alemães — e a falência do projeto da colônia. Nas últimas décadas, entretanto, têm surgido estudos nos quais já aparece a presença de escravos em Nova Friburgo, e se trata da importância da economia escravocrata para a região. Exemplos de trabalhos que trazem essas novas abordagens são as obras "Presença Negra em Nova Friburgo”, de Gioconda Lozada, e alguns dos artigos do livro "Teia Serrana”, produzido por professores da Faculdade Santa Dorotéia e da UFF, em que os autores vão além das análises celebrizadas, nas quais a população da cidade aparece marcadamente branca, europeia e livre. Esses estudos mostram que os escravos "friburguenses” tiveram suas raízes ainda no processo de formação da Colônia de Nova Friburgo, e mesmo antes. O historiador suíço Martin Nicoulin faz chegar às nossas mãos, ainda, a prova da existência de um quilombo, através de uma carta do colono suíço Antoine Cretton de Martigny, de 1824, sobre uma expedição em busca de terras mais quentes para a plantação de café. De acordo com o colono, a caravana formada por dezesseis indivíduos se deparou com negros fugidos na mata — numa região próxima a Lumiar.  A preocupação com essas fugas — e também com revoltas — de escravos parece ter atordoado os políticos da Villa que, reunidos na Câmara no dia 20 de dezembro de 1835, já atentavam, de acordo com o Fiscal do 3° distrito do Rio Preto, Silvério Roiz de Lima, em ofício à Câmara, "para os sustos em que se acham os moradores do distrito pelos estados de insubordinação dos escravos que diariamente vagam pelas estradas e fazendas [...] vizinhança, armados e proferindo palavras tendentes a uma sublevação”. O controle dos escravos era indispensável ao funcionamento de uma sociedade escravista, como era a friburguense à época. Mas também havia resistência, fosse através da cultura, de suas manifestações religiosas, de seus ritos; fosse, por vezes, através da fuga, da revolta ou da autoflagelação e morte.  Alguns grupos de escravos de Nova Friburgo parecem ter feito o possível para a sua libertação, organizando rebeliões, criando redes de comunicação e fundando quilombos. Outros parecem ter estado mais "inseridos” no sistema que lhes era imposto, buscando a confiança do senhor e a "comodidade” da casa-grande e do sobrado. Os processos criminais da época mostram a luta ideológica que era travada na tentativa de relegar os escravos a uma posição menos humana. Eles praticamente não aparecem como testemunhas; estas são brancas, livres. Os cativos serviam, no máximo, como informantes.  Caso interessante é o processo contra Antônio Pernambuco, Silvestre Crioulo e Valentim Moçambique, escravos de Boaventura Ferreira Maciel. Ele serve para ilustrar tanto a resistência e a negociação entre escravos e senhores, como para exemplificar a condição do escravo nos processos criminais.  O documento data de 1850, e versa sobre a fuga de dezenove escravos da Fazenda Ponte de Tábuas, nas cercanias da Villa de Nova Friburgo. Os cativos teriam fugido devido aos maus-tratos do feitor da fazenda, mas regressaram após alguns dias, a fim de negociar com seu dono. Numa noite chuvosa, os escravos se aproximavam da sede da fazenda, quando viram um vulto e o atacaram. Tratava-se do ferreiro, que acabou sendo assassinado por eles. O julgamento resultou na condenação dos três cativos organizadores da fuga. A exploração de temas como este é importante, inclusive, porque pode provocar uma mudança de postura da própria sociedade friburguense, e ajudar no resgate de parte da história dos escravos e de suas origens. Possibilita também uma maior valorização das raízes africanas da população e das contribuições das culturas de origem africana na cidade e no país. Eu discuti esse tema há alguns anos, em "Escravidão e consciência de classe na Nova Friburgo da primeira metade do século XIX”, um artigo de 2006, publicado pela Fundação Palmares, do Ministério da Cultura. Daniel Martinez de Oliveira
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