Técnico do Frizão: “É o pior momento. Precisamos do abraço da cidade”

Siqueira fala sobre 2017, perda de receitas e prevê dificuldades para a equipe em 2018
sexta-feira, 05 de janeiro de 2018
por Vinicius Gastin
Técnico do Frizão: “É o pior momento. Precisamos do abraço da cidade”

O ano de 2017 reservou momentos distintos para o Friburguense. A oportunidade de voltar a jogar uma competição nacional, a Copa do Brasil, contrastou com a decepção de quem esperava o retorno imediato à primeira divisão do futebol carioca. A permanência por mais um ano na série B Estadual apenas aumenta as dificuldades de um clube que há anos vive no limite financeiro, e praticamente faz mágica com o pouco apoio que possui. Sem as cotas de televisão e a partir de agora sem o seu patrocinador máster, o Tricolor da Serra precisa se reinventar novamente. Ou as consequências podem ser graves.

Em entrevista exclusiva ao A VOZ DA SERRA, o gerente de futebol José Siqueira, o Siqueirinha, faz uma avaliação sobre a última temporada e projeta 2018. O dirigente afirma que fez “o pior trabalho” à frente do clube em 20 anos, mas cobra um pouco mais de apoio da cidade como um todo. Com algumas dívidas, admite que terá que ser criativo e se mostra aberto  novas perspectivas: “Estamos abertos à grandes investidores, parcerias, independente de ficar ou não o Siqueira.”

AVS: O ano de 2017 começou com um momento histórico, que foi a participação na Copa do Brasil. O que o clube traz de positivo daquela partida com o Oeste? Faltou algo mais para conseguir avançar na competição?

Siqueira: “Devido à grande campanha na Copa Rio de 2016, perdemos oito jogadores da nossa equipe e isso atrapalhou muito para o primeiro jogo. Fomos com um time muito jovem, e fizemos até um primeiro tempo bom. Enquanto conseguimos um ritmo bom, igualamos e tivemos chances. Mas a gente já temia a falta de ritmo, por estarmos há seis meses sem uma partida oficial. O Oeste já estava no meio do Campeonato Paulista, na quarta ou quinta rodada. Isso faz diferença no futebol, e foi o que aconteceu no segundo tempo. Ainda tivemos a lesão de alguns jogadores experientes, e acabamos não passando de fase. Mas foi um momento histórico, pois há cinco anos não disputávamos uma competição a nível nacional. Foi uma grande festa, com a presença da torcida e vai ficar marcado de forma positiva em nossa história.”

Naquele jogo com o Oeste, mais de duas mil pessoas compareceram ao Eduardo Guinle, público que, nem de perto, se repetiu na série B Estadual. O Friburguense sentiu a falta de público nas partidas em casa?

“Eu costumo dizer que qualquer artista, independente da função que exerce, precisa de público, de plateia. Faz uma diferença muito grande. É o combustível, incentiva. A gente sempre compara com 2011, pois disputamos a segunda divisão apenas duas vezes em cinco anos, e naquela ocasião a torcida abraçou. Tivemos uma média de 700 a 800 pessoas, a melhor do campeonato. A gente precisa do apoio da torcida, da cidade, e isso foi muito reduzido. Sei que existem argumentos. Antes era preço de ingresso, mas hoje cobramos o mínimo de dez reais. Nova Friburgo está longe de abraçar a equipe de verdade.”

Algumas pessoas dizem que não vão ao estádio pela falta da referência de um jogadorfamoso em campo, ou por conta da qualidade dos jogos. É realmente isso que afasta o torcedor do Eduardo Guinle?

“Muita gente fala que o Friburguense não contrata um grande nome ou que o time não fez um bom campeonato. No primeiro jogo o público foi de 160 pagantes. Quanto a contratar um grande jogador, as pessoas não têm noção de como o futebol inflacionou. Em outras épocas a gente trazia jogadores de times grandes, mas hoje, qualquer atletaque inicia e sobe da base em um grande clube, já ganha uma faixa de 30 mil reais ou mais. Bancar um salário desse equivale a quase toda a folha de pagamento. Mas a verdade é que as pessoas não abraçam o Friburguense como o clube da cidade. É um desabafo mesmo. A gente sente que, por algum aspecto, até mesmo de tempos e rivalidades anteriores, pouca gente comparece.”

O Friburguense oscilou bastante dentro de campo durante a competição, e não conseguiu avançar para nenhuma das semifinais de turno da série B. Ficou a sensação de que o rendimento poderia ter sido melhor?

“Foi o pior trabalho que nós fizemos à frente do Friburguense, principalmente de minha parte. Iniciamos um ano para um jogo em fevereiro, pela Copa do Brasil, e tínhamos a previsão de receber da Federação quatro cotas de 90 mil reais, já que no ano em que você desce há esse finalzinho desse valor da cota de televisão. Lembro que no primeiro dia 10 recebi uma ligação da Federação dizendo que não teria esse valor de 90 mil, pois o Flamengo não havia assinado o contrato. Começamos a ter problema aí. Depois o valor veio pela metade. Naquele momento nós contávamos com o valor, que nunca faltou em 20 anos. A partir dali já comecei a tentar fazer dinheiro para não deixar faltar, o que atrapalha no envolvimento com o dia a dia do futebol. Nos perdemos um pouquinho. Eu vi que o lado psicológico em alguns jogos estava muito abaixo, principalmente dentro de casa. Sofremos duas viradas que nunca aconteceram, talvez porque não conseguimos o melhor trabalho que a gente faça junto à comissão técnica. Internamente trabalhamos mal. O ano começou errado na parte financeira e tudo desandou de um jeito que, quando percebemos, não deu tempo de recuperar.”

Diante desse cenário, dá para afirmar que o clube vive a situação mais complicada das últimas décadas?

“O Friburguense tem um trabalho terceirizado no futebol desde 2001, e esse é realmente o pior momento financeiro. Temos uma grande dívida de 2017 para eliminar, exatamente porque a cota de TV, de 360 mil, veio pela metade. Infelizmente não conseguimos renovar com o nosso patrocinador, e se contabilizarmos os valores que tínhamos em relação a julho, já são mais de 150 mil. Terminamos o ano com uma dívida na faixa de 400 mil reais. Precisamos buscar neste início de ano o apoio da cidade. Agora temos as propriedades, que eram da Stam, e precisamos vender para outras empresas. Vai ser diferente de tudo o que vivemos até hoje, sem as cotas de TV e de patrocínio. O pior de tudo é que as equipes menores, mesmo em uma segunda divisão, estão à frente do Friburguense porque existem investidores com uma capacidade financeira muito maior que a nossa. Estamos até abertos à grandes investidores, parcerias, independente de ficar ou não o Siqueira. Pode acontecer um grande investidor que seja melhor para o clube e a gente ficar fora. Tudo precisa ser analisado.”

O Friburguense já iniciou a preparação para 2018, com um grupo reduzido de jogadores. Dá para fazer algum tipo de projeção sobre a possibilidade de montar um time competitivo?

“Nós temos um grupo de jogadores emprestados para o Campeonato Carioca, Goiano, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte. Contamos com 12 ou 13 atletas e mais a nossa base. Mas precisamos dessa estrutura financeira, do apoio dos empresários e do poder público. Vamos procurar todo mundo e explicar a situação. Acho que esse gancho dos 200 anos pode ser bem aproveitado. O acesso pode ser um presente para a nossa cidade. Mas com os pés no chão.”

A falta de calendário, de apoio e de condições de investimento são algumas das consequências da permanência prolongada em uma série B de Campeonato Carioca. Caso o Friburguense não consiga um acesso imediato, quais podem ser as consequências a curto e médio prazo?

“Quando eu cheguei aqui em 1998, lembro de equipes que jogavam a primeira divisão naquela época, e hoje disputam a terceira. Outras não jogam mais nada. Há quanto tempo a gente não via o Serrano, Itaperuna, São Cristóvão, Campo Grande e outras. Hoje o Friburguense é maior, tem uma estrutura, mas se não seguirmos pelo caminho de a cidade abraçar, estar junto com a gente, principalmente na segunda divisão, estamos fadados a sermos uma dessas equipes futuramente. O calendário é até maior na segunda divisão, mas é complicadíssimo, pois não te dá condição de fazer um planejamento, um contrato maior com um atleta para não perdê-lo logo após uma competição. Ajeitaram um calendário para 80 clubes em um país que tem mais de 600. É um momento difícil, e precisamos almejar um trabalho de Centro de Treinamento, maior aproveitamento de jogadores da divisão de base e mudança de gestão. É buscar forças e tentar subir o quanto antes. A permanência por dois ou três anos na segunda divisão para uma equipe do nosso porte pode ocasionar um pedido de licença ou outra coisa, assim como aconteceu com times que já foram do nosso porte.”

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