Por um novo cenário cultural a partir do Casarão do Barão de Nova Friburgo

Entrevista com Luís Fernando Folly, presidente da Fundação D. João VI
sábado, 29 de setembro de 2018
por Ana Borges (ana.borges@avozdaserra.com.br)

A primeira e única exposição no Centro de Arte, após a inundação provocada pela catástrofe climática de 2011, foi realizada em 2012. Desde então, o espaço se encontra fechado, aguardando as obras que estão previstas para o início do ano que vem, na sequência do que já vem ocorrendo no Casarão.

Paralelamente, estão em andamento os trâmites legais e burocráticos que devem ser obedecidos para aprovação do projeto elaborado pela equipe da Fundação D. João VI e acompanhado pelo Inepac - Instituto Estadual do Patrimônio Cultural. Todo esse processo depende de providências diversas para que a reforma cumpra o cronograma estabelecido. São obras que abrangem desde o telhado e forro do “bicentenário” Casarão até o subsolo do prédio onde funciona o antigo Porão de Arte.

A condição física da antiga residência do Barão de Nova Friburgo, construído em 1840, há anos vem dando sinais de esgotamento estrutural. Sua resistência ao tempo se deve ao material usado em sua construção, como pedras e madeiras de lei, entre outros, e à espessura de suas paredes.

Mas, a manutenção paliativa, o uso inadequado de suas instalações, adaptações mal feitas, infiltrações não solucionadas, entre outros danos, ao longo de décadas, foram degradando a construção. Além das inúmeras mãos de tinta que esconderam as pinturas originais das paredes internas das salas, salões e corredores.

Segundo o presidente da entidade, o arquiteto Luís Fernando Folly, o Casarão foi doado à Fundação D. João VI pela Câmara e Prefeitura, em 2013. Antes da doação, abrigou a Oficina Escola de Artes, um importante ponto de cultura, para toda a região, criado no governo de Saudade Braga, em 2001, que funcionou naquele espaço durante os dois mandatos da prefeita. Ali foi mantido até 2012, quando o prédio foi interditado pelo Crea, Bombeiros e Defesa Civil. A Escola foi, então, transferida para a sede do antigo Fórum, onde está até hoje. A interdição se deu por problemas na parte elétrica e na estrutura do prédio, seriamente abalada pela inundação de sete anos atrás.  

Desconstruindo o  Bebete Castillo

Por estar num nível ainda mais baixo que o porão, o Teatro Bebete Castillo é sempre a área do prédio que mais sofre com enchentes, e foi a parte mais atingida pela inundação de 2011. “A água cobriu as poltronas e alcançou metade das paredes. Destruiu cabeamento, equipamentos de som, iluminação, as instalações próprias de um teatro, como a acústica que requer um revestimento especial, enfim, perda total. Perdemos as tábuas corridas do palco devido ao tempo em que ficaram submersas na lama, pela dificuldade de removê-la”, explicou Folly.

A primeira providência que a equipe da Fundação tomou quando assumiu o Casarão foi a de estudar o mapeamento de danos feito em 2009, que já apontava uma série de problemas. “O mapeamento é um documento linkado a todo e qualquer bem tombado, que aponta, item por item, todas as obras que devem ser feitas para sanar problemas que um patrimônio apresenta. Na gestão da Saudade Braga, tendo a Maria Amélia Curvelo como secretária de Cultura, toda a acústica do teatro foi refeita e o piso recebeu tratamento de campo de futebol para canalizar a água da chuva para uma galeria que passa aqui embaixo. Foi um trabalho muito bem executado e funcionou durante um bom tempo, até que o sistema colapsou com a enchente de 2011”, revelou.   

Em 2013, o mapeamento foi refeito e constatado novos vários problemas estruturais, “muito graves”. Ficou claro para a equipe que não era mais possível adiar uma reforma de grandes proporções. “Foi quando o Alexandre Meinhardt - presidente da Fundação, na época -, decidiu desligar parte da energia elétrica do Casarão, para uma análise. Descobrimos, por exemplo, que havia três sobreposições de fiação: uma, da virada do século 19 para o século 20; outro, da década de 1950; e outra ainda, do tempo em que a Câmara funcionava aqui. Desligamos duas fiações e deixamos ligado somento o sistema mais recente, que era o da Câmara. Do Centro de Arte, tiramos a energia de todas as salas”.

Longa jornada para recuperar o espaço histórico

Cada passo que vem sendo dado em relação à reforma do Casarão é discutido com o Inepac, que é o órgão responsável pelo seu tombamento. Entre 2014/15, foi feita a descupinização do prédio e a contenção de rachaduras estruturais. O telhado foi consertado e instalada uma manta no teto para proteger o interior das  consequências do tempo.

“Quando o então Porão da Arte foi projetado pelo Heródoto (engenheiro e ex-prefeito Bento de Mello), na gestão do prefeito Amâncio Azevedo, para que o espaço tivesse uma altura condizente com um ambiente voltado para atividades culturais, ele escavou o solo. Quer dizer, rebaixou o chão, já que não era possível rebaixar o teto, para aumentar o pé direito do porão. Dessa forma, toda a parte construtiva das sapatas originais, todo o baldrame (viga horizontal de construção) original do casarão ficou exposto. Para a época, essa alteração não causou nenhum problema na estrutura. A cidade era mais tranquila, havia muito menos trânsito. No entanto, hoje, o Casarão ‘treme’ o dia inteiro com a intensidade do tráfego. Aliás, toda a cidade sente essa força do fluxo de veículos, devido ao terreno arenoso do Centro. Então, tivemos que reestruturar algumas partes do madeiramento que é o teto do Centro de Arte, que por sua vez, é o piso do Casarão”, esclareceu Folly, que é arquiteto.

Ao longo de 2016/17, após minuciosos estudos e elaboração de projetos, pesquisas em órgãos públicos e entidades privadas, a Fundação concluiu que a Prefeitura não teria condições de arcar com os custos de um projeto dessa envergadura. “Então, diante dessa constatação, ano passado resolvemos criar a Sociedade de Amigos da Fundação D. João VI, uma iniciativa comum em vários países europeus e nos Estados Unidos, onde um grupo de empresários e membros da sociedade dão suporte financeiro a várias entidades, como museus e centros de cultura, por exemplo”.

Segundo o presidente da Fundação, o mesmo procedimento está sendo aplicado no Country Clube, com o Amigos do Chalé. A ideia é trabalhar a seguinte visão: por que eu tenho de salvaguardar o patrimônio e como eu, cidadão, posso participar disso?

“É óbvio que o poder público tem que estar associado a esse grupo também. Então, a partir da criação da sociedade, o prefeito Renato Bravo conseguiu uma verba que estava na Cultura e a Sociedade de Amigos conseguiu reverter cerca de R$ 170 mil, numa primeira leva. Usamos esse dinheiro para resolver os problemas do telhado e exterminar os cupins. Destelhamos todo o Casarão, retiramos toda a madeira estragada, descobrimos ninhos de cupim que mediam até 1.80m de altura. Trocamos ripas e caibros e colocamos uma manta aluminizada (isolante térmico que evita o surgimento de goteiras)”.

Há muito trabalho a ser feito que exige empenho e dedicação de todos os envolvidos. A pintura das paredes,  a recuperação dos desenhos originais, serão as últimas obras a serem realizadas. No entanto, o cronograma está mantido e vem sendo seguido.

“Nada nos impede de afirmar que, até meados do ano que vem, já tenhamos condição de reabrir o Centro de Arte, que é um ponto icônico e indispensável para a vida cultural da cidade”, encerrou Luís Fernando Folly.

 

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