Psicoeducação é a parte menos fácil da recuperação da saúde mental

quinta-feira, 01 de agosto de 2019

A pessoa que vai a um médico pode não estar pronta para obter a cura. Ela pode ir à consulta querendo alívio de sintomas, pode querer tratamento, o que é diferente de cura. Tratamento dos sintomas tem seu lugar, claro. Mas o que os provocou? O que leva alguém a ter crises de pânico, depressão, fobias, dependência química, anorexia nervosa, automutilação, doença afetiva bipolar, ansiedade excessiva, entre outros sofrimentos mentais? Qual a causa disto? O tratamento tenta eliminar os sintomas destas doenças. Mas eliminar sintomas é o mesmo que acabar com a causa deles?

Uma grande maioria de doenças mentais só pode ser curada se e quando a pessoa se interessar por entender as causas deles e tomar atitudes de lutar contra o que ela entendeu como a fonte de seu desconforto emocional. Infelizmente a mídia enfatiza muito o tratamento medicamentoso de doenças, o que interessa às indústrias farmacêuticas, deixando de lado informações sobre a importância do povo aprender – psicoeducação – a cultivar pensamentos saudáveis e lidar construtivamente com emoções difíceis e dolorosas.

Boa parte dos que vão a médicos, quer sair da consulta com uma prescrição de produtos químicos e não pensar mais em nada. É mais fácil tomar um comprimido do que mudar o estilo de vida que provoca a enfermidade. Entretanto, comprimidos e até cirurgias não podem resolver a(s) causa(s) de muitas enfermidades físicas e mentais.

Alguns ao relatarem sobre seus sintomas, nas entrelinhas de suas palavras podemos escutar: “Tenho estes problemas de saúde e não sou responsável por administrá-los.” É como se quisessem se esconder atrás da doença. Então falam da doença como se fosse um monstro, enquanto que não é bem assim. Alguns falam do diagnóstico que o médico deu quase como se fosse um troféu ou uma medalha que ganharam! A frase em geral é: “O doutor disse que eu tenho a doença X! Daí ele me deu este remédio dizendo que vou ficar boa”. O que pode faltar no médico e no paciente?

Se o médico passou o remédio tendo uma visão reducionista da pessoa doente, e tendo uma visão somente organicista da doença, sem contar com os fatores emocionais, sociais, familiares e até espirituais para a causa dela, faltará da parte dele explicar ao paciente que aquele problema de saúde pode ter origem no estilo de vida e que precisa ser compreendido para ser modificado e, assim, se conseguir bons resultados duradouros, e não só temporários por causa do tratamento só dos sintomas, seja clínico ou cirúrgico.

E o que pode faltar no paciente pode ser o interesse em dar uma olhada em sua maneira de viver, em seu estilo de pensar, de lidar com sentimentos e relacionamentos, ver o que trouxe de complicado e dolorido do passado que influi hoje no sofrimento que sente. Muito do trabalho que médicos em geral deveriam fazer, e que psiquiatras que atendem também com psicoterapia e psicólogos clínicos fazem, ao meu ver, é gradativamente, com gentileza, paciência, mas também com firmeza, ir passando para o paciente o conceito (e tarefas) de que ele tem sim capacidade de aprender a lidar com impulsos e sentimentos dele de uma forma que possa treinar controlá-los ao invés de sempre ser dominado por eles, ou que alguém “lá fora”, ou um medicamento ainda não usado, é que trará a solução.

Alguns parecem ter até um certo prazer em falar dos sofrimentos pessoais, o que pode ser uma maneira de pedir afeto e atenção. É algo meio narcisista, claro não consciente. O discurso destas pessoas sobre o que as fazem sofrer, tem muito que ver com se colocar fora da resolução das dificuldades pessoais. Por isso muitos pacientes precisam de psicoeducação mesmo, mais do que de medicação. Precisam entender que a recuperação da doença emocional deles vai depender primeiro de decidirem treinar autocontrole emocional ao perceber que falta isto em sua pessoa, e menos de medicação, menos exigência de ter gente por perto, e menos cobrança de apoio dos outros.

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César Vasconcelos de Souza

Cesar Vasconcellos de Souza

Saúde Mental e Você

O psiquiatra César Vasconcellos assina a coluna Saúde Mental e Você, publicada às quintas, dedicada a apresentar esclarecimentos sobre determinadas questões da saúde psíquica e sua relação no convívio entre outro indivíduos.

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