Uma visita a Fazenda de Sant´Anna

quinta-feira, 31 de maio de 2018

Na semana passada visitei pela segunda vez a Fazenda de Sant’Anna, de propriedade de Renato Monnerat. Acompanhava um grupo de suíços que foi visitar a fazenda de seus conterrâneos, os Monnerat e os Lutterbach, que há mais de um século atrás foram seus proprietários. A história da Fazenda de Sant’Anna teve início em 1857, com o médico Augusto de Souza Brandão, o segundo Barão de Cantagalo. Propriedade com 800 alqueires fluminenses, era uma das maiores unidades produção de café do país, e do mundo, em determinado momento. O trabalho de seus 1,5 milhão pés de café era realizado por quase três centenas de escravos.

Em Cantagalo, o auge da plantação de café foi entre as décadas de 1840 e 1870, apresentando a partir de então um declínio em todas as fazendas cafeeiras. Terras cansadas, sem adubagem, cafeeiros velhos e improdutivos, era esse o cenário no fim do século 19. Cantagalo padecia igualmente com problemas ambientais que iria se refletir na lavoura. O uso do machado, do fogo e da enxada, a devastação dos morros cobertos de mata virgem para o plantio do café provocou mudanças climáticas, como a irregularidade das estações e menos chuva.

Quando o segundo Barão de Cantagalo faleceu a Fazenda de Sant’Anna estava bem endividada. O seu filho, Augusto Brandão Filho, solicitou empréstimo a José Heggendorn Monnerat para saldar as dívidas da propriedade. Porém, esse se recusou a conceder o empréstimo e arrematou a fazenda em um leilão. O sobrinho e genro de José Monnerat, o coronel Sebastião Monnerat Lutterbach, passou a administrar a propriedade.

Sob a sua gestão, a Fazenda de Sant’Anna além do cultivo de café, passou se dedicar à lavoura branca, a fabricação de farinha de mandioca, fubá de milho, polvilho, rapadura, melado e aguardente em seu engenho com moenda de cana. A fazenda possuía um rebanho bovino leiteiro da raça indiana guzerá, carneiros e suínos da raça inglesa. Toda a produção da fazenda era escoada pelo trem que ficava apenas a quatro quilômetros de sua sede.

A fazenda investiu em uma fábrica de laticínios produzindo manteiga e requeijão com a marca Fazenda de Sant’Anna. O tetraneto de coronel Sebastião Monnerat Lutterbach, Renato Monnerat, adquiriu essa propriedade por razões sentimentais em preito aos seus antepassados. Pouco restou do imenso complexo produtivo e de sua grandeza no passado, mas a fazenda está bem conservada.

A casa de vivenda, em estilo eclético, tem dois pavimentos, e suas fachadas são apoiadas sobre colunas de alvenaria que exibem a base e capitéis que dão ao casarão leveza e elegância. Na composição da varanda, um gradil de ferro batido entremeado por delgadas colunas em ferro fundido sustenta o telhado. As paredes de alvenaria são decoradas com pinturas e afrescos. A sala ainda conserva o papel de parede importado da França bem como a pintura original da barra com motivos florais sobre um fundo imitando madeira.

Já o maquinário de outrora, a exemplo do moedor de milho e do descascador de feijão, está em um Centro de Memória na fazenda criado por seu atual proprietário. Todos estão em pleno funcionamento e foram apresentados ao grupo de suíços que esteve na fazenda. Nessa visita fomos muito bem recebidos com um delicioso almoço cujo prato principal foi feijão tropeiro. O grupo se esfalfou de tanto comer essa iguaria.

Fiquei atenta às perguntas e impressões dos visitantes. Entre todas elas, uma impressão me chamou a atenção, o espanto do grupo com a dimensão da propriedade no século 19. Um deles observou que a Fazenda de Sant’Anna fora maior do que o seu cantão. Nesse momento, abrindo uma janela do passado, pude entender porque os colonos suíços abandonaram seus lotes de terras, em Nova Friburgo, em busca do Eldorado, em Cantagalo.

  • Foto da galeria

    A máquina de descascar feijão faz parte do Memorial da Fazenda de Sant' Ana

  • Foto da galeria

    Feijão tropeiro como prato principal

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Janaína Botelho

Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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