Fazenda Santa Inês, trabalho e fé - Última parte

quinta-feira, 30 de maio de 2019

No artigo anterior escrevi sobre a Fazenda Santa Inês, localizada em Paraíso do Tobias, segundo distrito do município de Miracema. Foi uma propriedade rural do século 19, que passou pelos ciclos econômicos do açúcar, do café e do algodão, além da rizicultura paralelamente ao cultivo desse último. Da Fazenda Santa Inês resta apenas a parte central do engenho e a chaminé, construídos por volta de 1870, e que abrigavam um monjolo, máquinas de beneficiamento de café, arroz, milho, açúcar e produção de álcool.

Na segunda década do século 20, o segundo distrito de Miracema dava enorme contribuição aos cofres públicos do município de Santo Antônio de Pádua, não recebendo, em contrapartida, investimentos na localidade. Isso acarretou um descontentamento da população daquele distrito e em 1906, iniciou-se uma campanha separatista de Miracema em relação a esse município.

O capitão Antônio Ventura Coimbra Lopes, proprietário da Fazenda Santa Inês, foi vereador e prefeito de Santo Antônio de Pádua e um dos líderes do movimento separatista. Depois de três décadas de campanha, em 3 de maio de 1936, finalmente Miracema se tornou um município independente. Desde o mês de março de 1996, até os dias atuais, a Fazenda Santa Inês foi objeto de aparições de Nossa Senhora que vêm deixando inúmeras mensagens e concedendo graças, muitas delas reveladas em depoimentos dos agraciados.

Uma gruta foi escavada na rocha ali existente por indicação de Nossa Senhora, em locução interna, a uma vidente. No local das aparições foi edificado um santuário dedicado a Nossa Senhora Mãe do Imediato Consolo e igualmente uma capela, ambos franqueados à população nas procissões e ritos religiosos. A história da Fazenda Santa Inês não cessa em surpreender.

Em 2011, um sítio arqueológico foi localizado nessa propriedade na superfície rochosa de um córrego. Foram identificadas marcas de polimento e de amolação no local. Provavelmente estas marcas estão relacionadas à fabricação de machados líticos. Ao que tudo indica, pertencia a população indígena da etnia puri. Com essa descoberta, pode-se possivelmente encontrar algum sítio de habitação que forneça informações sobre o padrão de subsistência, as tecnologias usadas, as formas de moradia e caso haja sepultamento, conhecer-se sobre a morfologia do corpo humano das tribos que habitaram a região.

O advogado Roberto Monteiro Ribeiro Coimbra Lopes, atual proprietário da Fazenda Santa Inês, para preservar a sua rica história fez a doação dos livros contábeis da fazenda ao arquivo municipal Centro Cultural Melchiades Cardoso. Criou igualmente o Centro de Cultura e Memória da Fazenda Santa Inês. O acervo compreende mobiliário, livros, documentos, fotografias, utensílios domésticos, instrumentos rústicos, equipamentos manuais de trabalho do campo e objetos indígenas do sítio arqueológico descoberto na fazenda. Inúmeras peças de castigos de escravos fazem parte desse acervo.

Uma peça rara me chamou a atenção no memorial: um tronco de madeira utilizado para prender vários escravos pelo pescoço, uma forma bem arcaica denominada de libambo, que depois foi substituída por argolas de ferro. Através da memória oral há a informação de que houve uma rebelião de escravos na Fazenda Santa Inês e que mantiveram acurralados os membros da família no interior da casa-sede.

Dois ou três escravos que haviam se insurgido contra a rebelião foram mortos pelos companheiros de cativeiro. Um dos parentes do fazendeiro negociou com os revoltosos conseguindo pôr fim à rebelião. O Centro de Cultura e Memória da Fazenda Santa Inês possui o projeto “O Museu itinerante vai até você”. Mediante contato pelo telefone 22 9 9243 5040, pode-se solicitar o acervo do Centro de Cultura e Memória da Fazenda Santa Inês para uma exposição de seu valioso acervo.    

  • Foto da galeria

    A Fazenda Santa Inês foi objeto de aparições de Nossa Senhora que vêm deixando inúmeras mensagens e concedendo graças

  • Foto da galeria

    Tronco de madeira utilizado para prender vários escravos pelo pescoço denominada de libambo

  • Foto da galeria

    O advogado Roberto Lopes criou o Centro de Cultura e Memória da Fazenda Santa Inês

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Janaína Botelho

Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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