Superando a segmentação

quarta-feira, 07 de março de 2018

Se analisarmos a vida ao nosso redor, encontraremos uma série de elementos, todos segmentados. Ao longo do tempo, aprendemos, seja pela vida, seja pela história, a dividir as coisas. É verdade que, nas empresas, nas universidades e, até mesmo, nas escolas, convivemos com as divisões: as disciplinas estudadas eram divididas. Podemos lembrar que, em Português, tínhamos um professor de Língua, outro de Literatura e, ainda, outro para Redação. Sem muito esforço, verificaremos que   tínhamos um    professor de Química Orgânica e outro de Química Inorgânica e assim por diante, em todas as disciplinas.

Quando entrávamos em um templo religioso, os fiéis estavam divididos: homens de um lado, mulheres de outro; no restaurante da empresa, também lugares separados para grupos diferentes, todos divididos. A história dos romanos, antes de Cristo, fala de um provérbio latino: divide et impera (dividi e governarás). Os chefes militares desenvolveram táticas para dividir as colunas dos inimigos e, assim, vencê-las. Como consequência de tantas divisões, não seria difícil chegar-se   à separação dos gêneros: homens e mulheres. Enquanto a uns era delegada a ação da guerra e da caça, restavam às outras as tarefas domésticas e a educação dos filhos.

Muitos, em uma visão conservadora e até machista do mundo e da vida – como bem explica Jostein Gaarder, em “O mundo de Sofia”, colheram esses conceitos em Aristóteles que, por sua vez, os teve divulgados na Idade Média cristã por Agostinho de Hipona, chegando até nossos dias e aportando na América com os peregrinos do Mayflower, no século 17. Trata-se, portanto, de muito tempo de história para que os fatos possam ser transformados com a virada do século. Assim, os administradores, em suas empresas, e os políticos, diante da máquina pública, enfrentam uma burocracia que tudo divide.

É comum notar entre os governantes uma ação dupla: enquanto centralizam as ações econômico-financeiras, dividem as demais ações de governo, impedindo a integração entre seus colaboradores. Mesmo sendo bondosos e capazes de afagar seus imediatos, individualmente conservam a separação para que cada um os procure sem se relacionar com os demais. Evita-se, assim, qualquer associação de subordinados que possam vir a pressionar o governante. Para Nicolau Maquiavel, este governante seria o príncipe. Uma sociedade segmentada, socialmente assim concebida, é uma contradição em relação à solidariedade que muitos pensadores pregam.

A solidariedade torna-se impossível com tantas segmentações, permanecendo, apenas, dentro de cada estamento, como se fôssemos divididos em castas, como na Índia. Na verdade, nem as castas acabaram na Índia, nem a nossa sociedade ocidental, com tantas divisões estruturais, consegue atingir uma harmonia solidária. Não foi em vão que Montesquieu, em “O espírito das leis”, propôs um poder dividido, porém harmônico. A realidade mostra que a divisão proposta pelo iluminista do século 18 permanece, e a harmonia é a grande dificuldade dos governantes e talvez, por isso, o  filme “O quarto poder” seja tão claro em relação à imprensa e à sua força.

A mídia, com seus vários meios, consegue espaços cada vez maiores, manipula, se quiser, a opinião pública e enfrenta governos e poderes porque estes são divididos e pouco harmônicos. Até nossa bandeira nacional, com um lema típico da era das máquinas, “Ordem e Progresso”, separa claramente estas duas questões das outras, relativas à solidariedade. Um pensamento que complementaria este lema foi expresso pelo psicólogo Roberto Crema, vice-reitor da Universidade da Paz, em Brasília, em um congresso de educação do Sinepe do Distrito Federal: “A bandeira nacional carece de um lema próprio da era das pessoas e, para ser completo, deveria ser “Ordem e Progresso, Amor e Solidariedade”.

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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