Hoje é dia de folia!

sábado, 10 de fevereiro de 2018

“O carnaval não é uma festa que o Poder Público oferece ao povo, o carnaval é uma festa que o povo oferece a si mesmo.” (Goethe)

Eu poderia mergulhar nesse espaço para falar de origens, transformações, influências culturais e até personalidades desta festa única, arrebatadora, chamada carnaval. Mas hoje é dia de folia, de preparar a fantasia e escolher a máscara que melhor convém.

Mais do que uma festa, o carnaval é a catarse coletiva, a inversão de papéis sociais; quebra de tabus; subversão dos códigos estabelecidos; entre tantas outras interpretações que, em separado, jamais explicarão o fenômeno de sua existência.

Não. O carnaval não é uma celebração exclusivamente brasileira. Ainda que nos consideremos o país do carnaval. Apropriação deliciosa, capaz de dar voz a um povo que exercita a pilhéria política, o deboche, convive com o sarcasmo, a farsa, e segue em frente, cumprindo a rotina diária do trabalho sem abrir mão do sonho. Porque diante do que temos vivido, seja na esfera política ou social, o carnaval é mesmo o nosso melhor remédio.

Você pode até não gostar do carnaval. Mas ele não está nem aí pra você. Continuará existindo, se transformando; adequando-se aos anseios populares e tomando as ruas. Porque é a rua o cenário mais legítimo para o carnaval. Ocupar os espaços culturais urbanos, áreas de convivência social, unificando as gentes e dando visibilidade aos invisíveis e voz aos oprimidos; transformando o lavador de carros em mestre-sala; a costureira em rainha; o mecânico em ritmista; o pedreiro em compositor, são características desse manifesto coletivo.

A organização do carnaval em escolas de samba militarizadas, enfileiradas, cumprindo estatutos e normas institucionais, está perdendo público, adeptos e admiradores. Organizar o que na essência sempre buscou desconstruir o que é imposto, formalizado, burocratizado?  Esse modelo é festa para turista assistir, não para uma maioria que não tem acesso. A grande massa já não acha graça, não se seduz mais com alegorias gigantescas e com a ausência do ingrediente que o carnaval mais necessita: a espontaneidade. Não à toa, o povo está saindo na rua, agrupando-se em blocos, e isso é interessante e genial, porque não tem nada de fantasia ou uniforme com todo mundo igual, cada um sai do jeito que quer. “Isso é que é Carnaval! Porque Carnaval é subversão da realidade!"- diz José Ramos Tinhorão, 90 anos, jornalista, professor, crítico e pesquisador.

Não. Eu não sou contrário às escolas de samba. Sou um amante dessas instituições socioculturais, reconheço sua importância, mas é preciso que se repaginem enquanto produto, agentes e espaços culturais. Não é possível que uma agremiação exista apenas para desfilar no domingo de carnaval. Suas quadras são espaços culturais comunitários, podem ir além.

Num país em que as pessoas estão vivendo de salário mínimo, em que as esperanças se mascararam de desespero, e a incerteza tem sido o café da manhã da maioria, o trabalho comunitário/coletivo ganha importância além do espetáculo, dos quesitos, das notas e dos troféus.

É preciso, portanto, que os próprios agentes do carnaval se dêem conta da sua importância. Para que haja o reconhecimento da cultura popular é preciso que os populares também se apropriem da cultura, que se dêem valor, que se entendam como atores sociais capazes de mudar os rumos do país, do estado e de sua cidade. Porque a cidade é o reflexo do povo que nela habita.

E quem habita Nova Friburgo até a terça-feira gorda de carnaval é o cidadão comum. Hora de mostrar que somos nós que daremos rumo ao barco. Que somos nós os autores desses 200 anos que ainda não nos pertence, mas está em nossas mãos!

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David Massena

David Massena

David estreou nas colunas sociais ainda na década de 70. É jornalista, cerimonialista, bacharel em Direito, escritor e roteirista. Já foi ator, bailarino, e tantas coisas mais, que se tornou um atento observador e, às vezes, crítico das coisas do mundo.

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